Tempinho atrás escrevi 2 posts sobre split na Maratona e do porquê um amador NÃO deveria mirar em tentar um split negativo nos 42km, ou seja, correr a segunda metade mais rápido que os primeiros 21km. Aqui e aqui eu explico melhor, mas basicamente o ponto é: split em uma prova tem uma forte ligação com o TEMPO de duração do esforço, não necessariamente com a DISTÂNCIA. Como os amadores correm em sua absoluta maioria acima dos 2h55, o que parece ideal é que o split seja LEVEMENTE POSITIVO e não constante ou levemente negativo.
A fisiologia e os números NÃO dão suporte à recomendação comum de que você deveria acelerar na 2a parte da prova. Lembre-se SEMPRE: o conhecimento é subtrativo, sendo assim, é sempre MUITO mais fácil a gente saber o que NÃO funciona do que aquilo que funciona. E correr a 2a metade mais veloz não se mostra melhor nem mesmo entre os melhores do mundo em esforços por aproximadamente 3 horas ou mais. Mas lógico que você pode continuar tentando! Conheço muita gente que ainda alonga antes de correr, por exemplo!
Um dos argumentos usados ao defender o split negativo é que os mais rápidos (forte correlação com mais experientes) saberiam dosar o ritmo melhor. Pois abaixo você tem os ritmos das Maratonas de Buenos Aires de 2011 e 2012 (são as únicas da história dessa prova que oferecem parciais a cada 5km). Se fosse assim, veríamos uma discrepância no padrão. Repare nas ondas que eu volto depois.

Parece haver um padrão, os corredores atingem sua maior velocidade em média por volta de 15km e vão em uma constante perda de velocidade para depois tentar acelerar na parte final SEM ultrapassar o pico de velocidade, o que seria muito improdutivo, vale dizer, pois seria sinal de que você não deixou tudo na pista.
Já um recente levantamento interessante tentava provar que mulheres seriam melhores maratonistas que os homens. A ideia é que elas seriam mais prudentes, arriscam menos, tese bem aceita que você encontra suporte em qualquer livro vagabundo de Psicologia. Vejamos a diferença do padrão delas correndo com o dos homens. Repare que é o comportamento da Fisiologia não o da Teoria quem determina nosso comportamento na pista em uma distância.

Homens parecem de fato sair proporcionalmente mais rápidos, tanto é que no 30-35km ainda desaceleram enquanto elas já aceleram. Perto do final da prova elas aceleram mais que homens, mas ainda assim, estão mais lentas que elas mesmas no início. Quem está certo? Isso é chute puro, mas acho que esse padrão masculino é melhor porque o feminino está muito “acelerando” ao final, sinal de que sobrou muito no tanque.
Há ainda um dado que eu voltarei um dia mais pra frente. Abaixo você tem a dispersão de todos os corredores entre 2006 e 2016 (são mais de 55.000). As pessoas “abaixo” da linha preta correram split negativo e os “acima” dela correram positivo. Repare que a tendência (linha pontilhada em vermelho) não é o de quanto mais rápido, “mais negativo” seria. *Quanto mais próximo do canto inferior esquerdo, mais rápido é o corredor.

Sim, todos esses dados são associativos, ou seja, NÃO apontam causa, podem apenas ser casualidade. Mas o segredo é: é a ausência de ASSOCIAÇÃO (negativo ser melhor em levantamento associativo) que tira a sua suposta vantagem ou força. Mas eu quero que você veja ainda uma outra imagem…. o padrão de quem justamente correu split negativo:

Parece normal para você? Para mim não… a pessoa acelerando ao final desse jeito parece que ele está… roubando! Então veja a imagem abaixo feita com casos grosseiros de trapaceiros. Fiz uma fórmula no Excel para capturar quem estranhamente acelerava ao final da prova. Para vocês terem ideia, filtrei apenas quem fez split negativo, que acelerou demais e é impossível no Excel colocar NEM DE LONGE todos os os trapaceiros correndo! É muito triste! Imagine as provas brasileiras que às vezes têm UM único tapete intermediário… só imagine quantos escapam ilesos… *15km/h = 4´00″/km

E se tirarmos justamente os que roubam fazendo split negativo, a curva fica ainda mais positiva. Eu não quero convencer ninguém! Eu queria era encontrar algum raciocínio que explique que negativo é melhor que não se baseie na boa vontade ou na teoria, mas no observado na prática. Reforço: não consigo provar que o levemente positivo seja melhor, ainda que eu acredite nisso. Mas consigo ver que pelo que temos, que negativo não o é!
Outro dia eu preciso voltar com os gráficos com a distribuição por sexo em POA e BsAs. Prometo para breve!
Era isso!
*eu sei que há uma “armadilha” na chegada dessa prova em especial, mas o padrão de corte de caminho é MUITO maior ao longo de TODO o trajeto do que nos meus dias de maior pessimismo na humanidade eu poderia imaginar.