Arquivo da categoria: Ultramaratona

Por que corremos – (Why we run)

Corrigi mais uma lacuna de livros de corrida! Em Why we Run o autor e biólogo e (ótimo) corredor Bernd Heinrich faz uma investigação técnica e empírica do que faz homens e animais se deslocarem por longas distâncias.

Fui lendo o livro com uma sensação de alívio. Ele reconta sua aventura para encarar sua primeira ultra (160km). Se passa em 1981, mas eu lia me vendo fazendo as MESMAS coisas que vão ganhando força atualmente!

Há no mercado 2 discursos que tentam te empurrar! O primeiro é de que houve enorme progresso técnico na corrida por ciência e tecnologia. Ambas teorias não se sustentam. O maior avanço do atletismo se deu por causa da profissionalização!

O condicionamento está como em uma gangorra, com os pólos sendo “desgaste” e “recuperação”. O segundo discurso que tentam te vender é que você pode focar em um (recuperação). É a não-compreensão.

Heinrich não é IPI nem nutricionista nem treinador! Ele é 100% pele em jogo (skin in the game). Veja alguns trechos que separei e traduzi:

Eu precisava reduzir meu peso, mas como? Restringir calorias causaria um conflito em meu corpo (…). Meu corpo se defenderia restringindo o gasto (…). A redução calórica pode fazê-lo fraco, letárgico e lento reduzindo pouco o peso.”

Eu não sabia dizer o que meu corpo precisaria, mas estava confiante que meu corpo saberia, do mesmo jeito que o corpo de um animal selvagem sabe(…). Eu decidi que faria como um animal, meu corpo decidiria o alimento e a quantidade, desde que eu optasse por alimentos não-processados ou minimamente processados. Sem pílulas, sem suplementos.”

Normalmente o predador come depois da caça, não antes dela.”

Para aumentar minha zona de tolerância eu treinei para correr sem combustível (on empty), forçando meu corpo a utilizar a gordura como combustível quando meu glicogênio acabasse.”

“Correndo regularmente em estado depletado (sem alimento) eu simulava as condições de prova.”

 

Voltei! O livro é uma bela aula! E talvez a melhor delas seja entendermos que nós não devemos criar teorias por teóricos, mas tentar entender a realidade, pois ela é soberana! Foi isso que ele fez!

160km e 0 calorias

Você conhece o ultramaratonista Michael McKnight? Tudo bem, não é preciso. Como você só precisa de UM caso pra derrubar TODA uma teoria, McKnight nos serve! É o conceito do Cisne Negro, você precisa de apenas UM cisne negro pra derrubar a ideia de que todo cisne é branco.

Dias atrás um leitor me mandou o link de uma dessas revistas ruins (dessa vez era de triatlo) com uma nutricionista-vendedora explicando que carboidratos são essenciais ao desempenho (de triatletas) na longa distância.

De cara 2 erros. Primeiro, quem já trabalhou com isso sabe que uma revista nada mais é que um catálogo de vendas. Ela lutará para defender seus chefes, os anunciantes, no caso, fabricantes de suplementos esportivos. Nada melhor que uma vendedora diplomada pra fazer o serviço. E segundo, você JAMAIS deveria ouvir o que nutricionistas têm a dizer sobre esporte e desempenho. Quando um atleta meu deixa mexerem em sua dieta, eu tiro meu corpo fora, não respondo pelo que irá acontecer.

Basicamente os Nutricionistas IPI dizem que uma vez que nossa reservas de glicogênio (muscular e hepático, no fígado) são (bem) limitadas (e são!), você precisa toda vez que sair de casa, andar com um sachê de gel. Se eles tirassem a b&nda do consultório e fossem a UMA competição na vida veriam que esse raciocínio não sobrevive.

UM DOS objetivos do treinamento é fazer o corpo criar adaptações para fazer aquilo que atualmente lhe é inviável. E aqui entra McKnight e a restrição de carboidrato.

McKnight aderiu à dieta cetogênica para mostrar que é possível correr 160km sem ingerir nada além de água e eletrólitos. Como isso é possível? Vou falar em algumas linhas o que 99% dos nutricionistas não conseguem entender em 4 anos de faculdade…

Na restrição de carboidratos da dieta (seja ela low-carb, seja cetogênica, que é uma “very low-carb”, com menos de 50g diários desse nutriente) o corpo passa por adaptações fisiológicas, metabólicas e bioquímicas por semanas ”aprendendo” a retirar energia da gordura, quase “ilimitada” no corpo. Como? Com uma condição essencial: com níveis baixos de insulina que só é possível nas dietas de restrição de carboidrato (low-carb ou cetogênica). Reforço: você só fica BÃO em queimar gordura, restringindo o carboidrato. E o que manda o Nutricionista IPI? Que você coma MUITO carboidrato. Ou seja… o Nutricionista IPI é um OBSTÁCULO ao seu desempenho. Fuja deles!

 

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Quanto correr antes dos 42km? – parte 3

Em dezembro escrevi 2 posts (aqui e depois aqui) porque os leitores sempre perguntam sobre volume dos maiores Longos no treinamento pra Maratona. Um ENORME erro conceitual de MUITOS corredores (e mesmo entre treinadores!) é considerar que nosso corpo, nossa fisiologia, responde aos estímulos da DISTÂNCIA, quando na verdade na fisiologia o TEMPO é que é soberano.

Escrevi aquilo no vácuo de um estudo BEM legal de Barry Smith e colaboradores que encontrou numa amostragem de 9.000 que quanto mais LENTO o corredor, MENOR precisam ser os longos (em quilômetros, não tempo!). A explicação é BEM simples. A fisiologia de Eliud Kipchoge ou de sua amiga que corre em 5h26 obedecem a regras BEM similares quando falamos em TEMPO, mas MUITO distintas quando falamos em quilômetros.

Como a resistência de longa duração vai de pouco menos de 2h00 até cerca de 6h00 (segundo Valdivielso), o Longo teria que ser calculado por TEMPO, não quilômetros. Kipchoge faz 30km, já os lentos podem ficar com BEM menos (23km segundo o levantamento).

 

QUE ENTREM CAMILLE HERRONS E O RAFA MAIORAL

Herrons é a ultramaratonista americana que vem assombrando o mundo. Em texto da Canadian Running ela reforça a NÃO-linearidade dos longos, ou seja, 30km NÃO é o mesmo que 22+8km. Um grande querido, o Rafael Maioral, que corre como ela, diz que a metade da Maratona é o 30km (impossível não concordar!), OU SEJA, os 12km finais equivalem a 30km! É a NÃO-linearidade!

O que o amador NÃO gosta de admitir é que FISIOLOGICAMENTE seus 42km está mais próximo de Herron nos 100km do que dos 42km de Kipchoge, Mas de quem ele copia o padrão? Pois é… você entendeu meu ponto.

Herron disse que quando migrou para as ultramaratonas ela cometeu o erro de aumentar muito o volume. Não funcionou! 2 anos depois ela viu que a abordagem precisava ser diferente. Ela decidiu voltar então à abordagem que a mantinha… rápida (intervalados e SEM longos longões). E como ela mantém volume alto sem fazer longos longões? Ela faz longos normais, “curtos” e agrega uma outra sessão. Por quê? Porque 22km+8km é diferente de 30km! Quebrando assim ela mantem a qualidade!

É POR ISSO que a base não deveria ter grandes volumes, Mas aí é pra outra hora!

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De Desafios, a crise da meia-idade e o wannabe influenciador!

Um texto de chamada forte chamou minha atenção: demonstração de extremo atleticismo é a nova crise de meia-idade. O texto me chega uma semana depois de outro rodar o mundinho na corrida com o autor falando de uma doença gravíssima e muito séria: pessoas estão colocando Ironman e Maratona no currículo profissional. Como corredor, tenho medo de pegar uma doença tão grave.

Eu sempre tento ser cuidadoso quando toco nesse assunto porque parece haver não juízo de valor, mas se as pessoas poderiam ou não fazer o que elas fazem. Elas podem! Sempre! Não se discute isso! Porém, uma coisa que o texto original nos traz é uma questão de fato (não de opinião): o público de maratonas, ultras e triatlos de longa distância são pessoas de 40 a 49 anos, de renda e escolaridade acima da média. É coisa de adulto, que paga as contas e que tem dinheiro para comprar um de nossos bens mais valiosos, o tempo. Ou tente convencer uma dona de casa de baixa renda que ela pode deixar de fazer afazeres doméstico para fazer longão em ritmo de amador. Ela vai achar que você é louco.

 

Tenho muita experiência com esporte universitário e afirmo: é muito difícil fazer jovens correrem. Eles já (ou ainda) têm saúde, não chegaram à crise de meia-idade que os obriga a pedir biscoito (o “parabéns” nas redes sociais). Isso porque a garota tem a jovialidade ao seu lado que lhe garante elogios sem fazer muita força. Já o cara tem esportes mais legais que a corrida para ir conquistar o mesmo destaque. Veja bem, correr é chato, monótono, aborrecido e agride demais nosso corpo (triatlo é 3 vezes isso, só que agride bem menos). Um cara que joga handebol ou basquete bem, por exemplo, pode praticar algo que lhe dá enorme satisfação sem exigir desconforto 90% do tempo, como faz a corrida. Corrida é esporte de gente velha, sem talento para outras coisas. Aceite que dói menos.

Correr/triatlo é ainda coisa de gente velha que investe nesses eventos buscando algo em troca. Seja a saúde (que vai se esvaecendo com o tempo, essa entidade invencível e inexorável), seja reconhecimento. Que ninguém se ofenda, pois eu escrevo. Quem diz escrever não se preocupando em ser lido está claramente mentindo. Nunca acredite em artista que diz fazer apenas por amor (*aqui um adendo, nunca, jamais acredite em um ator em qualquer assunto). Isso é bobagem. Ele poderia ficar cantando no chuveiro ou interpretando somente ao cachorro dele. Ele quer público. Se não quer ser lido, não use a internet, tenha um diário de papel. Se está nas redes sociais sabemos o motivo. E sem modéstia, que nada mais é que a vaidade esperando aplauso.

Quer exemplo maior do que o que aconteceu semana passada com falsos perfil da adidas e da Nike enganando centenas de milhares de pessoas? Como diz um grandessíssimo amigo, o fingimento é o mal do século e de nossa sociedade.

Esses falsos perfis eram toscos demais e, ainda assim, quando fui dormir um deles tinha 4.000 seguidores e no dia seguinte eram mais de 100.000, reforçando a mim que velho e internet não combinam porque eles não podem ver uma vergonha que correm lá para ir passar. Porém, eu toquei no assunto fingimento porque a pessoa que corre por correr, ela já se completa. Ela não precisa exteriorizar um significado (você correria uma maratona se não pudesse contar a absolutamente ninguém?). Mas há uma insistência na ideia de que a corrida te faz melhor. Mentira enorme. O que esse golpe nos mostrou foi que dentro de cada corredor parece haver um wannabe (gíria do inglês quero ser) que finge correr de graça.

O que me assusta na época de BBB é quantas pessoas desejam ser famosas por… serem famosas. Isso é uma fama que obviamente não se sustenta por si só (a menos que você seja um/uma jovem sexy, daí dura até os 30 anos). Os famosos longevos o são em função de algo que faz bem, profissionalmente. E pudemos nesses falsos perfis observar na vida real como as pessoas querem ser famosas, influenciadores pela sua corrida amadora. Ela é a escrita aplicada ao mundo da corrida. O corredor/triatleta amador tem um enorme desejo de ver sua história ser contada, ser lida, a ponto de ficar fazendo isso por horas seguidas bem lento para que alguém mais o veja. É ISSO que o completa. O amador parece correr somente e somente se puder ou tiver sua história contada.

E nisso parece haver um significado de completar algo que lhe falta. O texto, e aqui eu discordo completamente dele, fala que treinamos para poder nos garantir de modo mais saudável anos à frente. O que o caso dos CVs com a marca do IM ou o desespero de ver sua história de amador ser contada por alguém que nem apresentou suas credenciais em troca de uns equipamentos, me dão a certeza que o esporte de ultra/longa duração sendo intrinsicamente tão chatos (e POUCO desafiadores), só encontra terreno fértil porque é um jeito de adultos termos nossa vida contada e vista pelos demais. Sem nos darmos conta, reforço, completa algo (seja saúde, talento, auto-estima, significado…) que falta em cada um. Os 15 minutos de fama prometidos parece vir à custa de muitos e muitos quilômetros.

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Reflexões – ultramaratona, Paris e “desidratação”…

Foram quase 3 semanas na Europa. Como sempre, fiz questão de achar alguma prova para participar. Quase cometi uma loucura. Uma vez que decidi fazer minha primeira ultramaratona, havendo a Maratona de Paris uma semana depois, pensei em fazer o combo ultra (89km) e 42km na França. Não me arrependo de ter sido racional e encostar a ideia.

ULTRAMARATONA

Falei um pouco no Facebook da minha estreia na ultradistância participando de uma Ultramaratona escocesa realizada há apenas 10 anos correndo 89km em asfalto plano entre Glasgow (a SP) até a capital Edimburgo (o Rio de Janeiro deles).

Meus treinos foram simples. Muito (muito) kettlebell para fortalecimento, treinos (de corrida ou não) praticamente quase todos sempre em jejum. Fiz 4 longos: três de 24km (um deles precedido por um treino de 1h00 de kettlebell) e um de 30km. Corri quase sempre com um Hattori da Saucony, um tênis minimalista no último grau. Em minhas conversas com quem já fez tal distância a dica era sempre a mesma: quanto menos tênis, melhor. Deixem os tênis estruturados para quem acredita em unicórnios.

No dia corri com um Saucony Type-A5. Claramente quem o projetou nunca correu na vida. Você não corre 5km sem pedras entrarem no solado. Imagine por 90km. Princípio Skin in the game: só treine para maratonas com quem já correu (forte) uma. Só corra com tênis feito por quem corre.

Desde quando amadureci a ideia de fazer uma ultra eu já sabia: não faria essas loucuras que vejo os amadores brasileiros fazendo pré-Comrades indo na Bandeirantes (famosa rodovia paulista) fazer 50-60km. Eu decidi não passar dos 30km. Fazer muito mais do que isso seria apenas cansaço, correndo o risco de se machucar. Desnecessário.

No dia acordei, comi uma fruta, peguei meus 4 gels, uma salsicha (queria o sabor salgado) e bebi bem pouca água e isotônico nos 5 postos que a organização oferecia. O frio e o vento eram parecidos (porém não tão fortes) como o da Maratona de Boston de dias atrás. Larguei e fiz força para não ultrapassar ninguém até a metade. Era a tática.

Minha agenda de treino era simples. De 2ª a 6ª feira pela manhã kettlebell (em jejum), almoçava e bem de noite de 1h00 a 1h20 de bicicleta ergométrica ou corrida (tiros ou rodagem). Sábado pela manhã o longo. Só.

MARATONA DE PARIS

A cada vez que presencio uma prova grande no exterior vou ficando sempre com a mesma impressão: passou de 5.000 pessoas e as provas ficam cada vez mais com a cara da nossa São Silvestre. Quando leio as críticas dos especialistas fico pensando que provas eles acompanharam.

A Maratona de Paris é uma dessas que fala com sotaque. A largada é muito organizada e linda, mas depois disso é um caos saudável. Em vários trechos se afunilam os corredores em uma procissão por uma única pista de rolagem. Não me levem a mal, a prova é espetacular. Só acho que somos desnecessariamente rigorosos com as provas brasileiras. É algo a se pensar.

A EXPO deles é incrível em variedade e pelo formato de colocar tudo que é concorrente em um balaio só, mas isso não resolve o problema do preço. Não comprei nada. Não valia. O que eu fiz foi experimentar (correndo na Expo com) o Enko (foto). Ele é mais uma prova de que é cada vez mais fácil enganar o corredor médio. Mais de U$350 por um trambolho. Use a palavra tecnologia, performance (em inglês), recuperação e outros truques que as pessoas gastam e rasgam dinheiro felizes da vida te agradecendo. Não consigo ter pena, desculpe.

COMMONWEALTH GAMES

Dias atrás um ciclista profissional morreu vítima de um ataque cardíaco e neste domingo durante a maratona que fecha o Commonweath Games (uma competição importantíssima feita entre os países do antigo Império Britânico) um escocês que liderava no 40km com mais de 2 minutos de vantagem “fuma” o motor, perde os sentidos e abandona a prova. Falaram de tudo… que o ciclista estaria vivo caso fizessem exames periódicos (como se nesse nível não fossem feitos) e que o maratonista chegou àquele ponto por desidratação, e não pelo calor infernal que faz na Austrália.

Todo problema complexo tem solução simples. E errada.

O escocês “superaqueceu” e a organização, que tinha um médico a cada 500m na parte final da prova, foi incompetente em não intervir. Dar copinhos de água não resolveria. Público não têm que fazer nada. Adversário também não. É amador que adora para depois fazer textão. Já sobre o ciclista belga, que os urubus de plantão esperem o corpo esfriar antes de querer vender a solução.

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O que há por trás dos amadores buscando desafios cada vez maiores?

No The New York Times uma matéria explicando como os amadores vão criando desafios cada vez maiores para se manterem motivados. Acho de verdade que isso dá material para um pós-doc de tanto que dá para desenvolver. Para mim quem faz isso não gosta tanto assim de correr porque tem que apelar ao quase impossível para manter uma rotina.

Um amigo diz que quem coloca coisas no açaí, não gosta de açaí, gosta daquilo que ele coloca no açaí para amenizar o sabor do… açaí. É como café com bastante açúcar, a pessoa gosta mesmo é de açúcar. No ramo da corrida, quem só consegue correr 100% do tempo com música, acha correr tão chato que precisa se distrair ouvindo música. Essa tara pelos amadores em sair correndo muitos quilômetros da noite para o dia é o paraíso dos ortopedistas. Na verdade é a operação Cavalo de Troia dos fisioterapeutas. “Corram… corram machucados para o meu consultório!

Sim, vivemos em uma sociedade imediatista. Você perde o cliente se disser que ele, um iniciante, só deveria correr 21km daqui 2 anos. Ele quer correr ESSE ano. Se você não treiná-lo ele não terá dificuldade em encontrar alguém disposto a aceitar o dinheiro pra fazer isso. Sempre que vejo isso fico curioso com a rotatividade dos corredores. Por que o que vai fazer alguém que no começo do ano nunca correu, ao final do ano correu 21km e no outro faz o Desafio do Dunga (5km/10km/21km/42km em 4 dias seguidos)?

Sempre me pergunto também o que gera tanta atração na classe média (alta) em sofrer nesses eventos. Ainda que seja um sofrimento relativo, mais teimosia do que desconforto prolongado. Justo ela que anda em carros confortáveis com ar condicionado, confortáveis como suas salas, também confortáveis. Que treinam 2h00 no sábado, mas trabalham e moram no 2o andar e sobem sempre de elevador.

Veja bem, não há NENHUMA inferioridade moral em fazer isso (muito menos em ter dinheiro!)! Mas o fechamento da matéria entrega tudo: a pessoa acha que ela sai mentalmente mais forte de uma ultramaratona. De onde a pessoa tira isso? Parece papo de psicologia vagabunda de RH que coloca vídeo motivacional do filme Gladiador, esquecendo que as pessoas ali eram escravas prestes a morrer (seu RH burro nem esconde de você que te acha um escravo). Qual a relação de um com outro? Correr te torna tão melhor quanto sair para fazer feira de 4a feira!

Eu acredito mais em compensação… que a pessoa busca um falso sofrimento compensatório. Não sem antes tomar todos os cuidados para que seja um sofrimento de laboratório, controlado, não muito difícil, pasteurizado. Como se os resultados fossem os mesmos nessa falsa mimetização de como era sofrida a vida de antepassados sem tanto dinheiro (mais pobres) ou sem tanto conforto (menos tecnologia).

E lógico, nada disso teria tomado essa magnitude não fossem as redes sociais, afinal, a pergunta não é minha, mas nunca foi tão verdadeira: você correria uma maratona se não pudesse contar a ninguém?

As 50 Maiores Corridas de Rua do Brasil (2016)

O Recorrido publica com exclusividade (aqui completo) os dados das 50 Maiores Corridas de Rua do Brasil em 2016. Este é um levantamento único no nosso mercado e busca principalmente colocar um pouco de luz dando números desse esporte em nosso país, uma vez que dependêssemos das organizadoras, não teríamos estatísticas confiáveis.

Comparado com 2015, pouca coisa mudou no perfil das 50 maiores provas. Os destaques:

– As 50 provas continuam com quase o mesmo número de concluintes (316.000), um aumento de apenas 0,7%;

Há cada vez mais mulheres (42% *já descontadas as provas exclusivamente femininas);

– As provas de 5km são as mais frequentes na lista. Em 3 anos passaram de 15 para 19;

– Já as de 10km são cada vez mais raras (de 13 a 7);

– Talvez por serem mais tangíveis, as provas de até 9km vêm ganhando bastante destaque.

top-50

Já a localização destas provas mostra-se bem concentrada. 29 em São Paulo e 13 no Rio de Janeiro. Apenas essas duas, Brasília e Fortaleza (com 2 cada) são locais de mais de uma das 50 provas.

Nenhuma fica na Região Norte.

Nenhuma na Sul.

Outra característica é notar que 4 organizadoras possuem 36 dessas 50 corridas! E das 5 maiores, todas já foram exibidas ao vivo na TV, mostrando a força desse fator em determinar o sucesso de um evento.

Porém, se ainda assim você acha que fazer corrida é fácil e garantia de muito lucro, vale destacar que mais uma vez duas corridas Top 50 foram descontinuadas de um ano para cá. Ou seja, é um investimento que está longe de ser garantia de sucesso!

O que você não pode deixar de dar é atenção às mulheres. 6 provas são exclusivas delas! E elas são maioria em 20 das demais 44. E talvez tenha que saber que nem toda prova grande é domingo de manhã! 8 são sábado à noite.

Para ver todos os números, fica aqui o convite para você ver o Infográfico das 50 Maiores Corridas do Brasil em 2016!

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Um pouco mais de ritmo na Maratona, split positivo e trapaceiros…

Tempinho atrás escrevi 2 posts sobre split na Maratona e do porquê um amador NÃO deveria mirar em tentar um split negativo nos 42km, ou seja, correr a segunda metade mais rápido que os primeiros 21km. Aqui e aqui eu explico melhor, mas basicamente o ponto é: split em uma prova tem uma forte ligação com o TEMPO de duração do esforço, não necessariamente com a DISTÂNCIA. Como os amadores correm em sua absoluta maioria acima dos 2h55, o que parece ideal é que o split seja LEVEMENTE POSITIVO e não constante ou levemente negativo.

A fisiologia e os números NÃO dão suporte à recomendação comum de que você deveria acelerar na 2a parte da prova. Lembre-se SEMPRE: o conhecimento é subtrativo, sendo assim, é sempre MUITO mais fácil a gente saber o que NÃO funciona do que aquilo que funciona. E correr a 2a metade mais veloz não se mostra melhor nem mesmo entre os melhores do mundo em esforços por aproximadamente 3 horas ou mais. Mas lógico que você pode continuar tentando! Conheço muita gente que ainda alonga antes de correr, por exemplo!

Um dos argumentos usados ao defender o split negativo é que os mais rápidos (forte correlação com mais experientes) saberiam dosar o ritmo melhor. Pois abaixo você tem os ritmos das Maratonas de Buenos Aires de 2011 e 2012 (são as únicas da história dessa prova que oferecem parciais a cada 5km). Se fosse assim, veríamos uma discrepância no padrão. Repare nas ondas que eu volto depois.

ritms-bsas-2011-2012

Parece haver um padrão, os corredores atingem sua maior velocidade em média por volta de 15km e vão em uma constante perda de velocidade para depois tentar acelerar na parte final SEM ultrapassar o pico de velocidade, o que seria muito improdutivo, vale dizer, pois seria sinal de que você não deixou tudo na pista.

Já um recente levantamento interessante tentava provar que mulheres seriam melhores maratonistas que os homens. A ideia é que elas seriam mais prudentes, arriscam menos, tese bem aceita que você encontra suporte em qualquer livro vagabundo de Psicologia. Vejamos a diferença do padrão delas correndo com o dos homens. Repare que é o comportamento da Fisiologia não o da Teoria quem determina nosso comportamento na pista em uma distância.

homens-vcs-mulheres-bsas-2011-e-2012

Homens parecem de fato sair proporcionalmente mais rápidos, tanto é que no 30-35km ainda desaceleram enquanto elas já aceleram. Perto do final da prova elas aceleram mais que homens, mas ainda assim, estão mais lentas que elas mesmas no início. Quem está certo? Isso é chute puro, mas acho que esse padrão masculino é melhor porque o feminino está muito “acelerando” ao final, sinal de que sobrou muito no tanque.

Há ainda um dado que eu voltarei um dia mais pra frente. Abaixo você tem a dispersão de todos os corredores entre 2006 e 2016 (são mais de 55.000). As pessoas “abaixo” da linha preta correram split negativo e os “acima” dela correram positivo. Repare que a tendência (linha pontilhada em vermelho) não é o de quanto mais rápido, “mais negativo” seria. *Quanto mais próximo do canto inferior esquerdo, mais  rápido é o corredor.

tendencia-splits-bsas

Sim, todos esses dados são associativos, ou seja, NÃO apontam causa, podem apenas ser casualidade. Mas o segredo é: é a ausência de ASSOCIAÇÃO (negativo ser melhor em levantamento associativo) que tira a sua suposta vantagem ou força.  Mas eu quero que você veja ainda uma outra imagem…. o padrão de quem justamente correu split negativo:

positivo-bsas-2011-e-2012

Parece normal para você? Para mim não… a pessoa acelerando ao final desse jeito parece que ele está… roubando! Então veja a imagem abaixo feita com casos grosseiros de trapaceiros. Fiz uma fórmula no Excel para capturar quem estranhamente acelerava ao final da prova. Para vocês terem ideia, filtrei apenas quem fez split negativo, que acelerou demais e é impossível no Excel colocar NEM DE LONGE todos os os trapaceiros correndo! É muito triste! Imagine as provas brasileiras que às vezes têm UM único tapete intermediário… só imagine quantos escapam ilesos… *15km/h = 4´00″/km

trapaceiros-em-bsas

E se tirarmos justamente os que roubam fazendo split negativo, a curva fica ainda mais positiva. Eu não quero convencer ninguém! Eu queria era encontrar algum raciocínio que explique que negativo é melhor que não se baseie na boa vontade ou na teoria, mas no observado na prática. Reforço: não consigo provar que o levemente positivo seja melhor, ainda que eu acredite nisso. Mas consigo ver que pelo que temos, que negativo não o é!

Outro dia eu preciso voltar com os gráficos com a distribuição por sexo em POA e BsAs. Prometo para breve!

Era isso!

*eu sei que há uma “armadilha” na chegada dessa prova em especial, mas o padrão de corte de caminho é MUITO maior ao longo de TODO o trajeto do que nos meus dias de maior pessimismo na humanidade eu poderia imaginar.

 

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