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De Chocolate, Achocolatado e pós-treino.

Essa semana falei rapidamente como em questão de 10 anos fabricantes de chocolate convenceram centenas de veículos, uma infinidade de profissionais de saúde e milhões de consumidores a achar que comer chocolate 70% é saudável (resumo: não, não é nada saudável). Tenhamos sempre em mente algo que funciona na vida que também SEMPRE funciona na Nutrição: nada nunca é de graça.

Em 2015 houve um episódio que mostrou a fragilidade e a baixa confiabilidade das recomendações nutricionais quando feitas em veículos impressos, TVs ou portais. Para demonstrar esse ponto, o jornalista John Bohannon divulgou propositadamente um estudo falso que dizia que “chocolate acelera o emagrecimento”. Sua Fake News foi publicada em TVs, revistas, em mais de 20 países, em mais de uma dúzia de idiomas, no maior jornal europeu e em outros diários internacionalmente famosos.

Então se chocolate não emagrece (e não é saudável)… POR QUE HÁ QUEM ACHE ACHOCOLATADO UM BOM LANCHE???

Bem antes da pegadinha de Bohannon, ainda em 2006 uma orquestragem da indústria nos enganou de outra forma. Fomos levados a acreditar que leite achocolatado (iguais aqueles que vêm em caixinha com canudinho) seriam bom repositores pós-treino. Um estudo (JOHNSTON et al) propositadamente mal desenhado foi financiado pela “Dairy and Nutrition Council” de um jeito a dar a entender que beber uma ou duas caixinhas após treinar forte era a melhor e mais barata alternativa de reposição alimentar. O resultado? Não deve haver UM veículo que cubra corrida que não tenha sugerido achocolatado como boa alternativa. Mas…

ELE NÃO É BOM. E EXPLICO OS MOTIVOS.

Tal qual isotônicos, achocolatados contêm água e energia. Mas contêm além disso proteína, cálcio e vitamina D. Porém, nutricionalmente falando, achocolatado é basicamente açúcar líquido disfarçado. MUITO açúcar. MAIS do que refrigerante.

Deixemos de lado a questão se leite pasteurizado é bom ou não (eu acho ruim). Esqueça que achocolatado engorda ou sabota sua dieta. Ignore que ele é feito basicamente com ingredientes artificiais ou que ele rouba o lugar de alimentos de verdade que você deveria estar consumindo. O que podemos com segurança afirmar é que achocolatado como lanche ou opção é UMA DAS PIORES alternativas que alguém pode escolher após o treino. Dizer que é melhor que isotônico não só não é verdade (o estudo não chegou a esse veredito) como não deixa de ser uma comparação esdrúxula, afinal, compara dois lixos nutricionais. Não deve haver profissional de saúde minimamente competente que sugira isotônico que não seja apenas DURANTE a corrida (ou qualquer outra atividade).

A estratégia de marketing feita com o chocolate 70% e com o achocolatado nos reforça de 2 pontos: um é que assim como qualquer outro doce, esses 2 produtos devem ser encarados como sobremesa, doce, indulgência. O segundo e mais importante é que quem mais se beneficia de chocolate 70% como saudável ou de achocolatado como pós-treino é a indústria que vende, não você que compra ou consome.

*prefiro não entrar na questão de mães que colocam achocolatado na lancheira de seus filhos

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Sobre Corrida, Jejum, Ramadã e o delírio de não encarar a realidade

Faz questão de uns 4 anos que publicações de corrida voltaram a dar destaque a algo que se faz há décadas: correr (ou fazer qualquer exercício) em jejum. Há um motivo fundamental para isso: é que para se gerar conteúdo, esses canais fazem um loop infinito, tal qual as antigas revistas de adolescente, eles revisitam de tempos em tempos o mesmo tema, afinal, algo precisa ser postado e publicado sempre, não importa sua qualidade.

Impressiona o hábito e tamanha insistência equivocada dos veículos em chamar treinadores para falar de Nutrição. Há um detalhe aí: você não deveria tratar desse assunto com treinadores como consultores, uma categoria que não estudou isso de modo central em sua formação. É como convidar um médico para falar em revista de veterinária, ou ter um engenheiro civil falando de Física no portal. Eles até sabem um pouco, mas seu raciocínio é quase sempre por aproximação, incompleto, falho.

E aí os veículos completam ainda com outro problema: convidam nutricionistas que têm enorme talento para falar bobagens. Não vou citar, vocês sabem quem são eles. Eles têm colunas fixas, uma característica muito comum de quem sabemos não ser muito bom.

Talvez o cerne da questão é que quem deveria entender a teoria criando hipóteses observando o mundo real faz tudo no sentido contrário, ou seja, eles dão mostras de não entender absolutamente nada. Por décadas as pessoas fizeram (e fazem!) atividade física em jejum sem NENHUM grande problema. Alguém estabelecer uma diretriz nutricional diferente não transforma a realidade!

Indo muito mais longe temos que o homem pré-histórico tinha que ter PELO MENOS um desempenho MUITO BOM em jejum. Houvesse hipoglicemia, tontura, desmaio, fraqueza ou perda de massa muscular quando não comesse de 3 em 3 horas, o homem antes do advento da geladeira, do supermercado e do micro-ondas, teria desaparecido, não teria conseguido correr atrás de sua próxima refeição. Quando um predador corre perseguindo sua presa ele não alonga, nem come “uma porção de carboidrato e proteína magra” antes. Sua preparação é a necessidade e a vontade. Seu corpo foi construído para que ele possa fazê-lo, não importando a bobagem que diga o colunista especialista.

Porém, o profissional da Saúde atual parece viver em um mundo de fantasia. Delírio esse sabemos não ser exclusivo da categoria dos nutricionistas, uma visita breve a portais como o da Sociedade Brasileira de Medicina Esportiva prova meu ponto. Aquilo é uma sequência de bobagens feitas por iletrados no assunto Nutrição. *e aqui nem vou perguntar se aquilo é de graça ou entrega de alguma compra, não creditemos ao mau-caratismo o que pode ser apenas explicado pela incompetência mesmo.

Quando fui escrever o capítulo sobre jejum para meu livro O Treinador Clandestino, eu tinha dificuldades em encontrar estudos que explicassem a segurança e mesmo efeitos benéficos talvez exclusivos do jejum na corrida. Eu não precisei ir até a Pré-História nem ficar nesses textos de 2013 para cá. Aliás, usava esses textos apenas para saber o que era errado. Não falham nunca! E minhas buscas meio que por acaso caíram em um termo conhecido que me abriu um mundo. Não era ele fisiológico, era ele religioso. Mais precisamente o Ramadã.

Os muçulmanos fazem jejum religioso um mês por ano, comendo e se hidratando apenas entre o pôr e o nascer do sol. Este ano, como ele sempre muda, foi de 26 de Maio a 24 de Junho. Quando você observa o comportamento de atletas que fazem jejum (seja nos países islâmicos ou entre os religiosos espalhados pelo mundo) você observa que: não há queda de desempenho, não há redução nas sessões de treino, não há aumento do número de lesões nem aumento de ocorrências médicas entre praticantes.

E uma matéria recente da Dyestat me chamou atenção porque trata de algo que deveria já ter ser sido visitado por quem escreve no assunto: como é a rotina de alguns atletas muçulmanos durante o Ramadã. Ou seja, como é a realidade deles (e não o delírio dos especialistas) para lidar com seus treinos e competições sem poder comer nem beber absolutamente nada durante o dia claro?

Impressiona que mesmo entre atletas que precisam competir bem, ou seja, entre pessoas que não são meros participantes recreativos. Esses corredores ou competem em jejum ou quebram o jejum apenas em competições, não em treinos. E vale reforçar que o jejum religioso não possibilita sequer beber água. Já o jejum intermitente não-religioso é mais brando porque permite ao praticante se hidratar com água, chás e café (sem açúcar), e mesmo refrigerantes light/diet.

A alucinação coletiva de nutricionistas, médicos e treinadores que dizem que jejum compromete a massa muscular ou a segurança do atleta não sobrevive a uma pesquisa preguiçosa de estudos ou, reforço, do mundo real de décadas de atletismo ou de milhares de anos que não viram pessoas definhar sua massa muscular. Isso porque o jejum aumenta a liberação de adrenalina (maior atenção e maior queima de gordura) e aumenta ainda a liberação de GH (que promove a preservação de massa muscular, não à toa um hormônio muito utilizado nos anos 80 e 90 entre atletas que queriam se dopar).

Pois bem, essa questão de jejum é só mais um exemplo de como devemos primeiro olhar o que acontece, para só depois formarmos nossas hipóteses que expliquem a realidade. Gostem ou não, pratiquem ou não, acreditem ou não, o jejum (com ou sem atividade física) existe há milhares de anos. Estabelecer por diretriz que ele faz mal não o fará… nos fazer mal. Isso é apenas pensamento mágico! *para não dizer pensamento burro.

 

Lição de Casa

Você deveria treinar em jejum para correr melhor? Eu acredito que incluir algumas sessões leves em jejum pode ser muito beneficial, sim. Porém, é puro achismo. A minha aposta é porque jejum é uma quebra de homeostase, pivô no treinamento físico. Mas esse texto não é sobre DEVER, mas sobre PODER.

Então podemos treinar em jejum sem maiores prejuízos? A prática diz que não sendo sessões extenuantes em volume e/ou intensidade, que sim. E mesmo entre os habituados, até essas sessões podem ser feitas em jejum. Ou ainda, escrevendo em um modo um pouco mais mundano: não havendo fome, POR QUE DIABOS ter que comer antes de sair pra correr?!?

Mas nunca faltará “especialista” que em seu delírio ou ignorância no tema não vá tentar negar a realidade.

 

*como dito, no meu livro O Treinador Clandestino falo sobre corrida em jejum. Pouco falo disso no livro O Nutricionista Clandestino, mas eles estão sendo vendidos impressos em um combo com valor promocional, basta clicar aqui!

 

 

 

 

 

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Sobre Lindy, Vovós e falsos especialistas. OU ainda: o Tempo como senhor da Razão.

Um dos temas que mais aprecio, mas sobre o qual eu dificilmente decido escrever muito é a latente ineficiência dos atuais tênis de corrida na diminuição das lesões nesse esporte. Se eu precisasse resumir em poucas palavras o recente histórico seria: nos últimos 40 anos os tênis ficaram maiores, mais pesados e (muito) mais caros. Agora os modelos convencionais contam com “tecnologias” que prometem um maior controle de pisada, maior amortecimento e um menor risco de lesões. Mas na realidade conseguiram oferecer com evidências apenas maior conforto, uma falsa sensação de maior controle (o que não é bom!) e menor resposta sensorial aos pés com suas entressolas mais espessas (o que com certeza é ruim). Ou seja, não há vantagem ou menor índice de lesões, porém dão uma falsa sensação de segurança, o que é muitas vezes contraproducente.

 A QUEM OUVIR? – O que é um especialista? O que é um falso especialista? Em quem acreditar?

Você não terá dificuldades para encontrar treinador dizendo que você deve treinar apenas com quem tem CREF, o que é uma tremenda bobagem; discurso de quem se preocupa mais com o próprio bolso do que com aquele que deseja correr. No campo das ideias, quem decide quem é e quem não é especialista é o tempo. E existe uma regra para isso, o Efeito Lindy, uma das heurísticas mais robustas que existem. O efeito diz que a expectativa de vida de uma ideia é proporcional ao seu tempo de vida.

Aplicado aos tênis de corrida, os maiores atletas por bem mais da metade do século passado corriam com tênis sem suporte. Desde os anos 70 a indústria tenta nos empurrar um novo conceito de tênis que não só não se mostra eficiente (como evidencia qualquer pesquisa preguiçosa que qualquer um pode fazer), como seus próprios tênis, de tão ruins que são como conceitos de calçados seguros, vão morrendo temporada após temporada.

Você pode enganar um corredor (nem tão) iniciante com suas propagandas chamativas, pode convencer o jornalista que só lê release, pode convencer aquele médico que faz lista de “tênis bom para o joelho”. Você apenas não engana duas entidades: Lindy e o Tempo.

É por isso também que não gosto muito de escrever sobre tênis. Não tarda para aparecer quem se encante com release e propaganda, mas quando olhamos no tempo vemos que a fragilidade dos argumentos não sobrevive a ele, uma vez que um dos discursos dos fabricantes diz que “esta versão está ainda melhor que a anterior” ainda que ela não tenha se mostrado em NADA mais segura que um tênis de corrida de 1965! É como o Comunismo/Socialismo, nunca deu certo em lugar nenhum, mas deveríamos continuar tentando. Para estes todos é muito triste quando o seu “mundo dos sonhos possíveis” encontra a vida real.

Fosse um modelo de tênis convencional de hoje superior aos da década de 60, o conceito desses teria morrido, mas continua vivo ainda que sem a força da propaganda. Por quê?

 

“Insanidade em indivíduos é algo raro – mas em grupos, festas, nações e épocas, ela é uma regra”. (Friedrich Nietzsche)

 

Por que tantos de nós correm com tijolos aos pés que NÃO os protegem? Por que comemos 60% das nossas calorias justamente do nutriente que é não-essencial à vida? Por quê?

Vivemos uma época racional regida pela irracionalidade de falsos especialistas. Muitos deles montam suas teorias na segurança de não ter que submeter alguém previamente ao que pregam. E é aí que nossas avós são melhores do que nossos nutricionistas. Se na saúde você tiver que seguir uma recomendação nutricional, marque um encontro com sua avó, JAMAIS uma consulta com um Nutricionista.

Sempre que alguém vem e me chama de polêmico (o que não é verdade), repare que provavelmente estou apenas a dar peso a pesquisas que com rigor contradizem o senso-comum, seja na Nutrição ou sobre com qual tipo de tênis que deveríamos correr. Afirmações essas que eu sei que acarretam danos à reputação dos falsos especialistas, os especialistas em release, ou os ignorantes por conveniência, estes os mais desonestos. As ideias desses não sobrevivem honestamente ao tempo. Veja: são 40 anos para provar que tecnologia ajuda. Sem provas. São 40 anos seguindo cada vez mais as diretrizes nutricionais: nunca tivemos um mundo tão obeso. Esses especialistas (nutricionistas e defensores da tecnologia em calçados) são vulneráveis à prova do tempo e esperam que a realidade mude seu funcionamento, não suas teorias absurdas.

AVÓS vs PESQUISADORES

Por isso insisto com uma heurística: quer ir ao Nutricionista? Converse com sua avó. Com enorme chance de acerto afirmo que 85% das vovós estarão certas. Menos de 15% dos nutricionistas têm essa taxa. Por quê? Porque elas, nossas avós, comiam alimentos que foram a base da nossa dieta por muitos séculos. O Nutricionista não, ele vive de um pensamento mágico de teorias de apenas 40 anos que jamais foram postas à prova. Ele não tinha muito a perder, nossas avós e antepassados tinham.

Com tênis de corrida não é diferente. Por séculos os corredores, que dependiam do sucesso de sua corrida, usavam calçados com pouco suporte. Por que então dar ouvidos a jornalistas, fisioterapeutas e médicos que NÃO estudam DE VERDADE o assunto (pseudo-especialistas) e cuja parte de seu sucesso depende justamente do SEU fracasso (lesão) na corrida? Há uma enorme dissociação de interesses, como em quase todas as áreas da Saúde.

Ou ainda, aplicando à teoria da Avó-Nutricionista, veja o tipo de tênis que os veteranos abaixo, que querem ganhar a prova, calçam e veja o que diz o ~especialista~ da revista/site de corrida de seu veículo favorito que quer vender tênis. Tire você suas próprias conclusões… já sabemos mesmo que ele é um falso expert.

imrs

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Treinandus Poucus Demasiadus Papus

Você conhece aquele que anda “treinando muito”, querendo “muito melhorar suas marcas” em algumas provas e ainda assim não obtém os resultados que tanto persegue? Pois os tempos atuais fazem necessário falarmos sobre a Síndrome do Treinandus Poucus Demasiadus Papus, uma desordem comportamental muito séria que se caracteriza por um platô do desempenho dessas pessoas na corrida. O indivíduo em questão é acometido por esta doença que impede o seu progresso apesar de todo o dinheiro investido e, muito mais importante, do considerável tempo de dedicação ou das sessões semanais treinando.

Esta síndrome atinge corredores dos mais variados níveis e de variadas idades, que vão em sua maioria entre os 20 e os 45 anos. A manifestação da Síndrome do Treinandus Poucus Demasiadus Papus pode se caracterizar por uma intensa preocupação com mais de um dos fatores abaixo:

– Tipos de pisada;

– Amortecimento do calçado;

– Flexibilidade;

– Equipamentos de vestuário (óculos, meias de compressão, manguitos…);

– Suplementos, BCAA e nutrição;

– Coleta de dados de treinamento (para posterior análise de seu treinador);

– Treinamento individualizado;

– Periodização;

– Fisioterapia preventiva.

O medo de fazer força nos tiros ou rodar em subidas, além de resistência ou preguiça de rodar muitos quilômetros (independente do ritmo) e ausência de treinos em temperaturas que estejam abaixo dos 15⁰C são outras características muito comuns a quem sofre da síndrome.

Não há um grande estudo analisando sua prevalência ou condição sine qua non de que sejam corredores de assessorias esportivas, e não sabemos se o Treinandus Poucus Demasiadus Papus é contagioso, endêmico ou exclusivo apenas de alguma microrregião (ex: Marquise do Ibirapuera), mas podemos estimar que pode afetar até mesmo cerca de ¾ dessas pessoas em maior ou menor grau, condição essa que não a diagnosticam como sofredoras da síndrome, mas sim que é mais fácil uma terapia de remissão ou mesmo cura.

Sabemos, sim, que aspectos sociais e ambientais parecem ter correlação positiva, ainda que não saibamos se de causa ou casualidade nesta síndrome. O que existem são fortes suspeitas como causadoras dela. Podemos teorizar que as fontes de informação por parte desses corredores acometidos são: conselhos de revistas de corrida, portais especializados da internet, além da simplificação advinda de postagens de incentivadores virtuais, os influencers, que em análise rápida de seu conteúdo, em considerável parte parecem sofrer do mesmo mal, em maior ou menor grau.

Mal este que NÃO parece ser adquirido por contato, via aérea ou sanguínea, já que se espalha mesmo em ambientes sem contato físico algum, como os grupos de Facebook e as redes sociais. E parece que pode ser diagnosticado por uma junta médica e de profissionais de saúde, dessas que você encontra facilmente em clínicas multidisciplinares com nome pomposo e/ou em inglês que enfatizam terapias preventivas com o intuito único de ganhar dinheir…OOOPS… de melhorar a saúde e o desempenho desses corredores amadores.

Falemos e discutamos, pois, de sintomas, prevenção, e medidas de tratamento por intervenção comportamental.

UMA SÍNDROME SÉRIA:

Dizem que é um passo importante ao doente admitir que sofre de um mal. Posso não sofrer hoje da síndrome, mas por um tempo considerável de minha vida como corredor apresentei alguns sintomas claros da Treinandus Poucus Demasiadus Papus. Fiz inúmeros testes de tipos de pisada, buscava amortecimento em calçados como alguém que procura o nirvana, alongava antes e depois dos treinos, já corri com tira sub-patelar, com munhequeira, de bermuda térmica e meia de compressão… comprei óculos de corrida, estudei os efeitos de suplementos, consumi BCAA, anotava dados como FC em repouso e volume de treinos… tudo. Por algum motivo que não a ingenuidade achava que meu treinador fosse algum dia analisar esses dados que nem mesmo eu hoje tenho o menor interesse pessoal. Hoje me considero curado. Mas tenho que me policiar a cada vez que alguém resolve me mostrar os belos gráficos que um GPS, aparelho que eu nunca tive, é capaz de criar.

Porém, ainda que curado, me incomoda ver tantos sucumbindo a essa grave doença…

Por outro lado, tive muita sorte por um período ter que treinar sozinho e ter entre meus colegas de equipe, corredores muito old-school. Correndo sozinho eu não tinha a tentação de perder tempo com o que não importa no resultado final, nem de ouvir dicas furadas. Treinando com veteranos rápidos e experientes aprendi o que nenhuma revista ou portal jamais me ensinaria. *Lembre-se sempre, revistas e portais tentam te vender os equipamentos das empresas que pagam por anúncios em suas páginas, e eles tentam ainda vender-lhe atalhos, que na corrida, simplesmente não existem.

Aprendi com eles que: correr bem é resultado basicamente uma questão de muito volume, de muita paciência, de muita regularidade e de muita dedicação. Para correr bem sem um desses “muitos”, você terá que ter a grande sorte de ter os genes certos.

E obviamente que minha sorte não me impediu ainda assim de perder muito tempo com coisa inútil. Porém, provavelmente foi meu interesse na área que me salvou de consumir um volume ainda maior dessas inutilidades e gastar dinheiro com coisas que atrapalham a corrida. Isso porque a base do que aqueles corredores experientes e rápidos me explicaram é que a corrida é simples. É quem vive dela e não quem corre que tenta criar a…

“ILUSÃO DA COMPLEXIDADE”

Alguns gurus, Revistas, Treinadores fracos, Portais, associações de Médicos, Nutricionistas, Fisioterapeutas e muitas outras pessoas da mais alta boa vontade vão tentar te enganar. Vão tentar dizer que o esporte mais simples de todos é complexo e exige cuidados maiores.

Com a internet ficou mais fácil consultar de modo simples as recomendações destes e você consegue chegar a um mesmo padrão de conduta que não encontra suporte nem respaldo em nada que não seja a vontade única deles de te vender um plano “individualizado” ou personalizado. Correr é um pé à frente do outro por milhões de vezes, mas dirão que há necessidade de testes, de equipamentos e planos pessoais e periodizados. Ao contrário de tudo o que fazem os melhores do mundo ou os que mais correm no mundo.

cientificamente

Quando alguém quer te vender milagres ou alguma bobagem, ela usa o termo ”cientificamente comprovado” em seus posts patrocinados nas redes sociais. É o jeito de querer rebuscar o simples. É impossível nos dias de hoje acompanhar toda a informação que é gerada. Por que não recorrer ao que funciona e é barato ou quase gratuito? Os adeptos da ilusão da complexidade tentam apenas encarecer o seu produto.

Na corrida não há muitos segredos.

 

 

 

Vejo corredores que não correm

Ninguém se considera fluente no idioma de Victor Hugo tendo aula na Aliança Francesa estudando 2 horas por semana, nem se considera bailarino dançando em festas a cada 15 dias, mas se considera corredor ao aparecer na assessoria correndo em média duas vezes na semana por pouco mais de 30 minutos. Encaram a maratona como uma tatuagem, uma vez feita, virou maratonista para sempre.

Corredor é quem corre, é tolo DEMAIS o debate de quem é (ou não é) “corredor”. Mas o texto é sobre evolução de marcas, e ela na corrida passa necessariamente sobre volume de sua prática. Pagar o boleto da academia não melhora sua carga no supino, empurrar uma barra pesada é que faz. Quer correr melhor? Vai ter que correr.

Como você pode saber se você vem sofrendo da síndrome?

Se você passa mais tempo aprendendo novos treinos, fazendo exercícios parados, pulando a corrida por treinos alternativos, e não vê suas marcas melhorarem, é bem possível que já sofra dela.

Voltamos então ao fato que corredor precisa correr. Consistentemente. E isso NÃO significa jamais perder um treino na mesma medida que ficar sem correr por meses e achar que vai melhorar é uma meta um pouco irreal.

DIAGNÓSTICO

Abaixo vão alguns dos sintomas clássicos do problema. Se você está em um platô de desempenho não condizente com seu tempo e volume correndo, não é necessário procurar ajuda, bastaria mudar a atitude.

1. Você não é metódico.

Corrida de longa distância é um esporte de paciência, repetição, persistência. Não há necessidade de você mudar seu treino semanalmente. Um dos benefícios das repetições de algumas sessões é você poder se comparar diretamente, aprender as respostas e as sensações que seu corpo lhe fornece. Pode parecer entediante às vezes, mas existem treino-chaves feitos por grandes corredores que os fazem de tempos em tempos para saberem e sentirem como estão.

Treinador que tem que ficar inventando treino para o atleta precisa é educar o atleta. Você não consegue imaginar um atleta de força tendo que a cada sessão inventar novas combinações, novos exercícios, novos aparelhos. O corredor também não precisa.

2. Você acha que precisa fazer muitas coisas.

Não há ainda gráfico assim correlacionando positivamente horas de Treino Mental (ou horas de Treino Funcional) com tempo na Maratona...

Não há ainda gráfico assim correlacionando positivamente horas de Treino Mental (ou horas de Treino Funcional) com tempo na Maratona…

Você pode correr leve (trote, rodagem ou mesmo ritmo de maratona) ou forte (velocidade de limiar ou acima disso, ritmos de intervalados). Você pode correr pouco, médio ou muito (longo). Isto tem sido praticado, testado e retestado há mais de 100 anos com muito mais sucesso do que você leitor encontraria em umas 3 vidas inteiras. Você corre no plano ou em terreno irregular (com subida).

Você não precisa pedalar, fazer spinning, aquarunning, nadar, fazer fisioterapia preventiva, pilates, cross-fit, power yoga… se você faz mais destes, você faz menos daquele (corrida). Corredores correm, grandes enxadristas praticam xadrez. Priorize o que é importante.

Se eu vendo suco de beterraba, vou querer te convencer que ele te faz correr melhor. Mas se eu quero correr bem, eu preciso é correr.

3. Você se preocupa mais com suplementos e BCAA do que com o volume de corrida.

Por algum motivo, que não vale discutir, damos à Nutrição um papel que ela não tem. Uma boa Nutrição é aquela que não atrapalha, não aquela que te faria correr melhor. Correr é o que te faz um melhor corredor. Ponto. O debate gordura versus carboidrato não deveria jamais ter saído do rodapé do apêndice dos livros de corrida.

Mas corredor é uma praga, ele acha realmente que para correr é necessário ter algum suplemento por perto. Sobre suplementos, existem 3 certezas:

– Se ele funciona, ele muito provavelmente já é proibido;

– Se ele não é proibido, ele provavelmente não funciona;

– Deve haver algumas pouquíssimas exceções, que não sabemos quais.

Não há suplemento que compense a sua falta de quilômetros no lombo.

4. Você corre mais volume para manter o peso

Se você corre para manter a forma e o peso, sua dieta é errada. Se ela é errada, você tem um problema. E não serão os suplementos a resolver uma dieta ruim. *a parte complicada é que dificilmente também será um Nutricionista

5. Seus treinos mais parecem uma propaganda de margarina

Você já viu fotos com pessoas comendo salada? A menos que você seja um vegano por opção ou uma capivara por nascença, comer salada é quase uma lição de casa, o maior prazer de uma refeição não está no maço de espinafre, mas está na gordura, na carne, no tempero, na sobremesa.

Tire a salada e o sorriso é parecido com fotos de gente correndo em publicações

Tire a salada e o sorriso é parecido com fotos de gente correndo em sites e revistas

Se você está rodando sempre sorridente, se seus tiros mais parecem um happy hour de 5ª feira, parabéns! Você colocou esporte em sua vida da forma mais prazerosa possível! Mas se você quer muito melhorar e não melhora, é porque ainda não entendeu que alguns treinos doem, incomodam, são desconfortáveis.

E não precisam ser todos! Nem mesmo a maioria! Aprender a correr forte é aprender a conviver na corrida com o desconforto. Quando olhamos aos treinos dos melhores atletas do mundo, vemos que não mais do que 2 ou 3 treinos semanais são realmente difíceis. Poucos treinos são muito difíceis. Mas o desconforto está muito presente, em maior ou menor grau. Ninguém é bom sempre sorrindo.

Por outro lado, é fácil ser “guerreiro” uma vez por semana, ou pior, alguns tiros de um treino na semana. Os melhores são os guerreiros na mesma frequência, mas treinam (ainda que leve!) nos outros dias.

6. Você passa mais do que 5 minutos fazendo abdominal

Se você não enxerga seu abdômen definido, você precisa perder gordura, não ficar fazendo abdominais. Perda de gordura localizada com abdominal ficou lá nos anos 90. Se você faz mais abdominais do que faz flexões de braço, por exemplo, você provavelmente está fazendo isso errado. Abdominais cansam, roubam sua energia e pouquíssimo fazem para melhorar sua corrida.

7. Você faz “core”… e usa Swiss Ball, Bosu ou qualquer outro equipamento que te faz parecer um… deixa pra lá!

Não tem como isso dar certo...

Não tem como isso dar certo…

Você consegue imaginar UM corredor bom (mas bão-bão, não o mais rápido na esteira da sua academia) chegando para treinar carregando uma Swiss Ball (aquela bolona gigante) ou uma pranchinha de (des)equilíbrio? Pois é… Eles servem para gerar… desequilíbrio. Não te deixam forte nem te fazem correr melhor. Foque no que importa. Mais tempo na FitBall é menos tempo correndo

8. Você quer correr como Mo Farah com um corpo de velocista

frangoUma verdade que dói aos homens: quanto mais você correr, mais frango você ficará. Quando maior o bíceps, menos você correrá. Existem alguns vídeos patrocinados com caras fortões tipo cross-fit ensinando como correr melhor… esses caras fazendo exercícios estranhos não aguentam duas voltas no quarteirão em um ritmo forte de 10km. Corrida é sobre deslocar massa, com ombros de estivador você não vai longe. Não vai ser pulando no mesmo lugar que você ensinará seu corpo a se deslocar por 15km. Não será correndo mais que você vai crescer. Tenha isso em mente porque é mais honesto!

 

Menos é mais.

Menos é mais.

9. Você usa canelitos, tiras subpatelares, meias de compressão, kinesio tape, viseiras no escuro, manguito no calor…

Corrida de longa distância é entre outras coisas ensinar e ajudar o corpo a dissipar calor. Se você corre fantasiado com muita roupa, você roda menos, se você roda menos, você corre pior. Deixe o estilo para os dias de muito frio (menos de 12⁰C). E a tira subpatelar você deixa na gaveta mesmo.

10. Você está correndo ou aquecendo? Não consigo ver diferença…

Aquecimento é aquecimento. Ele deve ser leve e é essencial para um melhor desempenho, seja em treino ou prova. Ele não pode cansar nem comprometer seu desempenho (na prova ou treino). Tem vezes que olho para alguém que estaria treinando, mas parece que é tudo um eterno aquecimento. Você deve conseguir diferenciar bem as velocidades de aquecimento, de treino e a que você passeia no shopping. Lembre-se: muitas vezes haverá certo desconforto quando falamos de treino buscando melhora de desempenho. Se o conforto é do mesmo nível que o do aquecimento, o treino não começou. Aquecimento a mais é treino a menos. Desaquecimento a mais é treino a mais. Abrace a diferença.

11. Sério que você faz isso?!? Pra correr melhor!?!

…sério mesmo?!?

12. Sem migué.

Tiros de 1.000m são tiros de 1km, não de 950m. Pausa de 1 minuto são 60 segundos, não 1 minuto e meio. No treinamento de corrida de longa distância, respeito à pausa é FUNDAMENTAL. De certa forma, manipulando as pausas eu consigo fazer alguns treinos do Bekele. Mas ainda que mexendo livremente nas pausas NÃO consigo sequer chegar perto dos fisiculturistas finalistas do Mister Olympia ou do velocista Justin Gatlin. Reforço: as pausas na longa distância são cruciais.

Ou seja, se você termina seu tiro 50m antes, você está também dando migué porque mexeu na pausa. Engana a si mesmo.

13. É sempre você quem corre, não seu treinador.

Treinador ajuda. Mas se você tiver ele sempre ao lado comentando e falando em TODAS as repetições, isso mais atrapalha do que ajuda. Você precisa aprender a correr, a obter os sinais que seu corpo lhe dá, sem treinador palpitando ao lado. Ele não estará lá no último quilômetro da prova. Aprenda a lidar com a realidade. E isso nos leva ao próximo sintoma.

14. Você é obcecado por informação

Corra mais, pense menos. Alguns dias correrá bem, em outros correrá mal. No calor será mais lento, no frio mais rápido. Dados não significam informação. Se fosse, a pessoa com o melhor GPS ganharia. Aliás, dá para falar com grande segurança que quanto mais frequência você obtém dados, PIOR. Isso te cega, tira sua percepção e o foco do melhor gadget que existe: seu corpo.

15. Você acha que treino funcional é fundamental.

Se você não consegue fazer um agachamento completo, até o chão, igual à música Na Boquinha da Garrafa, só com a barra, sem anilhas, você não precisa de exercício funcional, você precisa é fazer agachamento mesmo! Agachamento com barra livre ainda é melhor exercício do que qualquer protocolo funcional jamais criado ou prescrito. É mais simples, mais rápido, mais barato e… funciona muito melhor.

Uma barra faz mais por você do que as Swiss Ball, o Bosu, as pranchas de instabilidade, as máquinas-para-fazer-perna-do-tamanho-de-uma-geladeira… todos esses juntos.

16. Você se desespera porque acha que correr melhor te fará uma pessoa melhor.

As pessoas que mais gostam de você não fazem ideia dos seus tempos pessoais. Eu não sei dizer os tempos dos meus melhores amigos corredores, dos meus ex-atletas. Quem se importa com suas marcas são talvez os que não gostam de você. Isso diz um pouco sobre a importância de melhorar as marcas. A vontade de correr muito melhor tem que vir sempre de dentro porque ela não vem de fora. Você até sabe quem correu abaixo dos 40 minutos nos 10km, mas daí para baixo é tudo igual. 31 é igual 34, 36 igual 39, 41 igual 49, e por aí vai. Isso vale para quase todas as provas, todos os níveis e todas as distâncias.

É uma sensação indescritível bater uma grande marca pessoal, mas ninguém vai ficar mais feliz do que você. Faça por você. E só por você. Senão se decepcionará.

O tipo da sua motivação te levará longe, muito longe.

17. Você tem todas as desculpas para não treinar.

Um grande amigo, estacionado há uns 10 anos nos 43min, esses dias não correu porque quando chove forte “caem mais aviões“. Não ria, eu sei que ele falava sério. É uma arte saber quando o corpo precisa ir mais devagar. Algo muito diferente é você não treinar por lesão ou dor. Diferente é se você não treina aos finais de semana, nos feriados, dias festivos, quando está calor, quando está frio, quando chove, quando garoa, quando está abaixo de 15⁰C, quando está cansado, quando acordou muito cedo, quando dormiu tarde, quando tem provas, quando fez hora extra, quando está tarde…

Empurrado ao limite, há basicamente 2 dias: os com treino e os sem treino. O dia de treino que você não treinou, não importa a razão (que não seja lesão!), conta como dia sem treino, ou seja, reduz o volume, reduz a consistência e reduz a essa hora você já sabe o quê.

As pesquisas e estudos da Síndrome continuam

Obviamente não dá para esgotar os sintomas e características dessa grave doença. Se for caso, vou atualizar este post. Quando estava para terminar, li uma passagem de um texto de Steve Magness que fala um pouco da nossa loucura e delírio coletivo em nossa relação contemporânea com as redes sociais. Cada um tem uma relação própria com elas e também com a corrida, não há certo nem errado neste assunto, mas existem padrões. Sobre os leões de treino que sempre informam seus treinos, Magness disse:

Há um truque simples para reconhecer a falsa raça, quanto mais você falar sobre o quão durão você é, maior é a probabilidade de você ser um falso raçudo. Por quê? É insegurança. No fundo, essas pessoas sabem que realmente não são raçudas. Elas têm de criar uma falsa impressão para convencer os outros de que têm dedicação, perseverança e todas as outras palavras da moda. Elas falam de seus feitos e treinos pesados. Elas são os que postam fotos no Instagram treinando na chuva ou no mau tempo, ou postam no Facebook sobre como treinaram duro no Natal, quando todo mundo descansava. Elas precisam desesperadamente do mundo os vendo como dedicados. Elas não acreditam que são, por isso elas precisam de reafirmação e reforço social.

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*este texto não é um plágio, é uma homenagem xupinhada por completo mesmo do talvez mais incrível artigo já escrito sobre treinamento de força, o Fuckarounditis.

 

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De Bandidos, Pipocas e São Silvestre

Sendo sucinto: nunca antes dessa São Silvestre (SS) tinha visto em um evento de corrida tamanho número de corredores-bandidos, os Pipocas. Aliás, esse nome bonitinho de Pipoca nada mais é do que um jeitinho bem brasileiro de “passar pano” em infrator, temos receio de dizer que um crime tem um infrator. Porém, houve consequências! Faltou água a muitos dos mais lentos.

Correr como bandido é tão errado quanto ir a um concerto de rock pulando o muro porque ele era muito caro ou estava esgotado. É como roubar a cerveja de uma mesa em um bar porque você queria.

Corridas gratuitas e baratas existem e os parques são públicos. Porém, espaço público não significa necessariamente “de todos ou para todos”. Tente você fazer um churrasco no quintal do Palácio do Governador. Ou então andar de carro em Interlagos no dia da Fórmula-1. Há regras para tudo.

Não quero aqui convencer um corredor-bandido a não mais pipocar, até porque quando você quer passar por cima da lei, você cria o seu próprio raciosímio. Quero apenas explicar o que Yescom e veículos de corrida precisam fazer.

O que o Metrô e o Trem em SP nos ensinam sobre os Corredores-Bandidos

A cidade de SP tem um dos metrôs mais limpos do mundo. As linhas Amarela, Verde e a Azul são, além disso, civilizadas. Já a linha Vermelha é limpa, mas não é civilizada. Os trens de SP não são limpos nem civilizados. Mas todos, sem exceção, estão debaixo de um mesmo guarda-chuva: as leis estaduais. Como isso é possível?

Há duas teorias sobre o porquê infringimos as leis. Há uma, a mais popular, que diz que é uma questão de pesar custo e benefício. Seria, ainda, uma questão de “a oportunidade fazer o ladrão”. Se compensa e há pouca chance de ser pego e pagar por isso, você rouba, do contrário não. Roubar um banco dá muito dinheiro, mas você pode ser preso. Você pesa os 2. Alguns poucos toparão, a maioria de nós não. Dirigir bêbado pode matar, mas ninguém é preso. A maioria não fará isso, mas muitos de nós irá dirigir embriagado, porque não há punição que não seja a própria consciência. Mas muitos de nós não irá dirigir bêbado por outra razão: a pressão social.

Pressão Social como combate ao Corredor-Bandido

A teoria de custo e benefício para uma irregularidade é mais do que incompleta, ela tem inúmeros furos. Ela é explicada brilhantemente em A Mais Pura Verdade Sobre a Desonestidade por Dan Ariely.

O porquê somos honestos (ou não) tem a ver também com o que fazem aqueles à nossa volta. Todos sabemos ser errado derrubar lixo no chão do Metrô. Ou do Trem. Mas na Linha Amarela ninguém joga lixo no chão. Também por conformismo e por pressão social, procuramos uma lixeira. Por ser normal a sujeira dos trens, jogamos lixo e acotovelamos assim que saímos da Estação Pinheiros (Amarela) para fazer a baldeação para pegar um trem. O errado em um (Amarela), passa a ser o padrão em outro (Trem), ainda que as regras sejam as mesmas. Há aceitação social de que é permitido sujar e empurrar no Trem. Mas você se sente mal fazendo isso no Metrô.

Sabendo disso, a Yescom e outras organizadoras em seus eventos precisam fazer algumas coisas essenciais. Vamos a elas:

O Chaveiro e os Corredores-Bandidos se encontram

Se você já chamou um chaveiro, você deve ter se impressionado com a facilidade com a qual ele abre a porta trancada. Um cadeado é fácil de ser violado, mas ele afasta 99% das pessoas, até mesmo aqueles que roubariam por uma questão de oportunidade. Porém, há o 1% que irá tentar roubar ainda que você use 5 trancas. A Yescom (e as outras organizadoras, lembrem-se) tem que inibir os 99% e caçar o 1%. Como?

Existem neste quesito 4 tipos de Corredores:

  1. O corredor que não é bandido;
  2. O que não sabe que é errado ser bandido;
  3. O bandido por oportunidade;
  4. O bandido por essência.

Como criar cadeados de corrida que inibam os 99%.

Esqueça o corredor 1! Ele sabe o que é errado. Mas o 2 precisa ser educado!

Acreditem, eles existem aos montes! Falo por mim, na minha vida corri 4 ou 5 provas como bandido porque não sabia que era errado. Deixei a minha vontade de fazer a prova suplantar o meu não-direito de estar lá. A corrida é um dos esportes com maior entrada de novos praticantes. As pessoas passam a correr sem saber regras básicas e mínimas desse esporte! Assim como treinadores e revistas educam o beabá, precisam ensinar que correr como bandido não é correto!

Não há hoje nenhum movimento de assessorias, veículos, revistas, portais, patrocinadores e organizadoras em educar o corredor. Isto precisa mudar!

Os “cadeados” para estes bandidos e para o do tipo 3 (o bandido por oportunidade) são de 2 tipos. O primeiro é que o corredor precisa sentir que correr inscrito é vantajoso para ele! O corredor precisa ter a impressão de que ele perde quando é bandido. Há várias formas de isso ser feito. As empresas precisam:

Dificultar o acesso à saída. Os 10km Tribuna em Santos por exemplo cerca a largada e a chegada da prova. Nada é pior do que você correr menos do que a distância. Grades nas ruas que dão acesso à SS. Esta pode parecer uma solução inútil, mas lembre-se da questão da oportunidade. O cachorro vira-lata entra na igreja quando vê a porta aberta, mas uma barreira física, por menor que seja, inibe até o ser humano. A pessoa pode não achar errado correr uma prova aberta, mas achará errado ter que pular uma grade para fazer isso.

Dificultar o acesso à chegada. Novamente, não é inútil. Retirar as pessoas bem antes da Avenida Paulista, ainda na Avenida Brigadeiro Luís Antônio tira a percepção de valor porque correr a distância completa e na Paulista são 2 dos maiores charmes do evento.

– Kit na chegada: o corredor se impressiona com kit “gordo”. Seja uma toalha ou viseira ou qualquer badulaque na chegada, dá ao corredor-bandido a impressão que ele perde.

A pressão social como cadeado ao Corredor-Bandido

Um dos argumentos mais prejudiciais do corredor devidamente inscrito é o de achar normal, não se incomodar. É como achar OK uma pessoa jogar lixo no chão do Metrô. Há um ponto da virada onde vários sujando, tornarão o Metrô da Paulista mais sujo que um trem indiano, ficaremos mais parecidos com o sujo Metrô de NY. A pressão tem que vir da enorme maioria.

Se achamos errado o corredor-bandido em uma prova beneficente, há como tirar 2 benefícios nesse sentido. Se as organizadoras reverterem parte da inscrição a uma ONG séria, famosa e completamente desassociada da empresa, isso cria uma pressão social.

Exemplo: se fica BEM claro que R$5 ou R$10 vão para uma causa de apelo social, há uma pressão de todos os lados, do inscrito e do não-inscrito que não estará roubando apenas da Yescom ou inscritos, mas também de alguém com menos condições. Isso comprovadamente funciona!

Outro argumento muito usado pelo corredor-bandido é que há pessoas que não têm condições econômicas de arcar com a inscrição. A Yescom, como todas as demais organizadoras, deveriam por obrigação moral e social oferecer vagas a pessoas carentes. Algumas já fazem, não sei se a Yescom faz. Isso cria um apoio e pressão social em favor da empresa. Mas quem argumenta que a pessoa vai sem inscrição por causa do dinheiro revela algo muito grave: correlaciona a má conduta ao nível sócio-econômico do corredor. Isso não é só ignorância no tema, mas um preconceito asqueroso.

A responsabilidade da Yescom e organizadoras

Que ninguém me acuse de aqui inocentar a Yescom. Ela tem culpa no cartório! MUITA! Mas há também cúmplices e testemunhas oculares que pouco fazem. O problema dos corredores-bandidos na SS (ou na Volta da Pampulha ou Meia Internacional do Rio de Janeiro) só irá voltar a níveis aceitáveis quando houver vontade de quem organiza o evento. Inclusive os patrocinadores.

Os patrocinadores como incentivadores

Na transmissão da Globo parece que o narrador disse que não importa se inscrito ou não, o importante é participar. Não são únicos nesse comportamento bizarro. Todas as organizadoras e patrocinadoras, todos, sem exceção, mentem inflando números. Para TODAS as empresas, patrocinadores e fabricantes de tênis, SEM EXCEÇÃO, um número gordo é mais importante do que a satisfação de quem corre. Repito: sem exceção. Não escapa ninguém.

É um tiro no pé porque parecem querer agradar a quem não foi correr! Isso TEM que mudar.

Resumindo, o problema dos corredores-bandidos só vai melhorar quando:

– Houver “cadeados”;

Dificultar o acesso na largada e chegada…

– Valorizar a percepção de valor da prova também no dia;

Dificultar completar a distância, oferecer mimo (toalha, viseira…)…

– Criar pressão social

Educar o corredor (antes, durante e depois da prova), fazer parceria com alguma ONG…

– Organizadoras, Veículos especializados e Treinadores fizerem sua parte.

Organizadoras e patrocinadores precisam priorizar quem paga, não quem assiste. Mentir nos números é sinal claro de quem é importante para eles. Veículos e Treinadores precisam educar os corredores!

– Os inscritos fizerem sua parte

NÃO ao discurso do ódio! Porém, tolerar 100% o corredor-bandido é jogar contra.

A Suíça e o Corredor-Bandido

Não há solução 100% eficaz, existem ladrões suíços e na Suíça, mas ainda assim há combate e esperança de zerar infrações. Há de se reduzir os corredores-bandidos. Havia nesta SS 18 copos por corredor! DEZOITO. Foram roubados cerca de 100.000 copos de água. Eu não quero convencer o corredor-bandido por essência porque este é incorrigível. Lembre-se, há gente que não tem correção, ele entortará a lógica para se fazer certo. Mas podemos e devemos fazer o trabalho dele mais difícil e deixar claro que ele não é nunca bem-vindo.

Há solução! A Yescom tem boa parte da culpa. Mas tem também a solução que não pode vir sozinha. Vamos ver se Yescom, concorrentes, patrocinadoras, fabricantes de calçados e muitas pessoas honestas realmente querem o fim dos corredores-pipocas.

Por enquanto nem todos querem. Infelizmente.

 

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De Trump, bolhas, volume e Maratonas

Uma fórmula que não funciona conosco não a torna necessariamente errada na mesma intensidade que dar certo para meia dúzia não a torna certa. Previsões, médias, medianas… funcionam de certa forma assim. Isso me leva até o Donald Trump, que daqui 2 meses será o homem mais poderoso do Planeta. A cegueira dentro de uma bolha era tão grande que parecia que era impossível que ele ganhasse. É o vício de buscar reforço em nós mesmos ou naqueles de quem estamos próximos. Até agora os jornalistas-torcedores, teimosos e míopes, não entenderam. “Se não aconteceu entre os meus, não pode dar certo”, é o que pensam. Semanas antes foi com Freixo, candidato carioca, o mais-novo-melhor-quase-prefeito que esse mundo já produziu, quase tão bom quanto outra “unanimidade sem voto”: Haddad. Freixo ganhou no Leblon e em meu Facebook, porém, perdeu no mundo real, aquele que importa de verdade. “Não conheço UM eleitor do Crivella, não pode ser verdade…”

Pois alguns dias atrás falei de uma tabela para previsão de tempo na Maratona. Sua grande novidade para mim é que ela se baseia em apenas duas informações. Esqueça VO2máx, FCs, métodos de treinamento, Ritmo nos Longos… ela pede tão somente seu volume semanal de treino e um tempo em uma prova recente na preparação. É, ainda que com todas as suas limitações, de certa forma incrível.

Eu tento ao máximo não partir para o campo do pessoal. E obviamente que algumas pessoas não perderam tempo para dizer: “não funciona, no meu caso deu X minutos mais lento (que a realidade)”. *E ela parece de fato ser conservadora dentro do padrão de treino dos brasileiros.

A maior sacada dela é que ela reduz a distância mais “magia” da corrida em algo que pode ser decifrada usando 2 dados simples. O que não é matemático quase passa a ser. O pessoal do 538, que fez o algoritmo, considera que correr 42km exige volume de corrida e uma determinada velocidade. Ele tira daí sua estimativa. Periodização, estratégia de hidratação, tática… nada! Eles acham que precisam saber quantos quilômetros você corre. Não importa o ritmo! Repito: não deixa de ser uma abordagem incrível. E ela é mais do que isso. Ela é lógica!

Correr 42km é muita coisa! Sempre que vejo corredor amador se preocupando com suplemento, equipamento, recuperação pós-treino eu penso: esse cara quer ganho marginal quando aos 95% que realmente importam ele não dá a devida atenção. Ele treina de menos, mas massageia de mais. Ele roda de menos, mas toma suplementos/BCAA de mais nos treinos. Ele tem quilômetros de menos, mas equipamento de mais. Isso é generalizado! Duvida?

Em uma matéria sobre treinamento de Maratona na Runner´s World, a mais importante revista de corrida do mundo, eu contei os caracteres. Nutrição ocupou quase METADE (47,8%) do espaço! Longos e Volume de treino ocuparam (juntos!) – atenção – 15% dos caracteres. QUINZE. Não pode ser possível… 42km é uma Maratona de corrida, não de comida!

Nutrição ajuda, mas não decide! Volume e Longos são ESSENCIAIS. Você pode correr a prova com uma dieta de lixo, porém você NÃO a corre fazendo a dieta dos sonhos, PORÉM SEM treino. A revista praticamente acha que a primeira coisa que um jogador de futebol precisa fazer é primeiro escolher por muito tempo a trava da chuteira e depois, talvez se der tempo, nos 15% finais ir jogar bola.

Voltando à fórmula, é óbvio que não há mal NENHUM em você apontar uma inconsistência de uma fórmula usando um exemplo pessoal. Duvido que os criadores não contavam com isso. Para mim o diferencial dela é justamente simplificar o que parece tão complexo.

Pretendo em 2017 voltar a correr novamente uma Maratona. Quero fazer um treinamento completamente diferente de tudo o que eu já fiz na vida. Mas tenho uma certeza, tal qual Steve Magness quando relatou semanas atrás o que encontrou ao olhar seus treinos do passado e percebeu quando mais melhorou: era uma questão de volume (muito) e consistência (muita).

Os céticos dirão que foi porque ele tomava BCAA e lanchinhos pós-treino. E rodava nos 15% restantes.

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Obrigado pela recepção!

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Em seu ensaio de 1973, Theodosius Dobzhansky, biólogo evolutivo ucraniano naturalizado americano, afirma logo em seu título que Nothing in Biology Makes Sense Except in the Light of Evolution (Nada na Biologia faz sentido exceto à luz da evolução). Danilo Balu discorre sobre o que deveria ser óbvio: um predador tem que sobreviver e ter, no mínimo, um bom desempenho quando em jejum. A primeira mutação em uma espécie que provocasse, digamos, hipoglicemia e tontura durante o jejum, a levaria à morte por inanição no dia seguinte ao seu desmame. Entretanto, teorias baseadas em suposições e wishful thinking, difundidas por profissionais com importantes credenciais e até mesmo suas associações oficiais, nacionais e internacionais de renome, invertem toda a fundamentação da Ciência. Para eles, os fatos devem obedecer à teoria e não o contrário. Mas esses são os fatos: quando um guepardo prepara-se para caçar, ele não come uma barrinha de cereal. Seu pré-treino é a fome, a gana de comer e vencer, numa caçada a 110km/h, a luta pela sobrevivência.

***

capa_treinador-clandestino_altaPoderia ter sido eu, mas somente o médico Erik Neves, um dos caras que mais respeito, poderia ter essa elegância de escrita e raciocínio. Espero que aqueles que se aventurarem em O Treinador Clandestino possam entender melhor o rumo do debate atual da corrida no Brasil.

Pude ainda contar com menções na Contra Relógio, no Webrun e no Sua Corrida. Além de participação em entrevista no Corrida no Ar!

Obrigado a recepção!

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Ir ao Nutricionista na Saúde faz mal.

Um dos estudos mais interessantes que li este ano fala sobre a REDUÇÃO na mortalidade por complicações cardíacas quando os cardiologistas estavam FORA do hospital*. Basicamente funcionaria assim: com os médicos presentes eles se sentem na necessidade (e na exagerada confiança e obrigação!) de intervir nos pacientes, matando alguns (que não morreriam sem a intervenção deles!) e salvando outros. Em sua ausência, não tendo quem fizesse a barbeiragem, a Mãe Natureza tomava conta da situação. É a arrogância e ingenuidade tão humanas personificadas em doutores que usam jaleco achando que nossa intervenção pode controlar com enorme segurança sistemas complexos.

Ainda este ano terminei de ler também Antifrágil – coisas que se beneficiam com o caos de Nassim Taleb que explica com calma como que, durante a saúde, cada visita nossa ao médico nos aproxima da morte. Basicamente deveríamos buscar a intervenção humana em assuntos da Saúde se e somente quando estivermos muito necessitados (doenças graves). Por quê? Porque toda intervenção humana, sem exceção, implica riscos grandes, muitos desses riscos ainda subestimados e desconhecidos. É por isso que ao contrário do que pensamos, exames de rotina da próstata NÃO aumentam a sobrevida e mamografias deveriam ser postergadas ao máximo (provavelmente aos 50 ou 60 anos) **. Erros médicos matam mais do que qualquer câncer nos EUA, por exemplo. É como ter um revólver hipotético com espaço para muitas balas e cada ida funcionar como uma rodada de roleta russa com essa arma.

E é por isso também que treinador deveria ser fundamental apenas e somente quando NÃO buscamos saúde (não é o objetivo maior dele te oferecer isso), mas quando você quer correr uma prova como uma Maratona, ou ainda uma prova como 10km em um tempo específico. Mas hoje encostemos um pouco a corrida, falemos de um dos maiores assessórios supérfluos, perigosos e subestimados em seu risco: a Nutrição.

A Nutrição, resumidamente ainda é uma falsa ou pseudociência por motivos bem simples, mas bem claros. Primeiro, ela estabelece a prática em função da teoria SEM examinar sua validade, e não o contrário, o que deveria ser a regra. Em muitas de suas diretrizes, há enorme carência de evidências básicas, como as que dizem respeito sequer à eficácia e, talvez mais importante, segurança. Exemplo? Consumo de Sal, balanço calórico, consumo de QUALQUER nutriente, razões que levam ao emagrecimento (ou engorda).

Quando eu digo que você não deveria ir ao Nutricionista, não é questionando a boa-vontade, mas sobre a ENORME incapacidade dele de diminuir os riscos da intervenção. Ir ao nutricionista, é como o dito sobre o cardiologista, ele faz uma intervenção em sua dieta trazendo enormes riscos à sua saúde. O Nutricionista assim somente deveria ser buscado na hipótese de doença (ainda que no caso da diabetes, um nutricionista convencional é muito perigoso).

Com certeza há nutricionistas competentes no mercado. O problema é que o modelo da profissão implica que ele vá seguir o que é dito pelos conselhos, ou seja, sem evidências científicas e sob o risco de ser fiscalizado e punido caso não siga o regimento. E também porque uma vez paga a consulta, há uma pressão enorme para que ele(a) intervenha, ainda que ele(a) não seja necessário, ou mesmo inconveniente.

Um nutricionista, assim, não deveria JAMAIS ser procurado na saúde. Uma vez procurado, ele não deveria JAMAIS prescrever uma dieta*** e deveria haver ainda estímulo para que se o fizesse, fosse o mínimo possível.

E onde procurar informação sobre Nutrição?

Dentre os livros mais incríveis que li até hoje sobre Nutrição, apenas um (Obesity) foi escrito por uma nutricionista, Zoë Harcombe (ainda que ela não seja nutricionista de formação). Todos os outros foram escritos por pessoas de outras áreas. Isso porque o progresso aos saltos não acontece em reuniões de conselhos, geralmente vem por mentes que pensam diferente, olham de fora, questionam sem os vícios. Por experiência própria e por estatística, NÃO espere um livro incrivelmente bom se ele tiver sido escrito por um nutricionista. Mas isso não é uma razão forte por si só.

E onde ir? Revistas e sites?

Definitivamente não. A escolha de um colunista em revista obedece a combinação de alguns critérios. Um deles é a sua titulação. E ela não tem muita importância em uma ciência que não cumpre o básico. Um doutor em Macumba não faz a Macumba virar ciência. Outro critério é a base do “companheirismo”, se é brother, conhecido de quem comanda a seção. Outro critério é se o Nutricionista é um bom vendedor de produtos e suplementos. São os anúncios da revista que pagam a conta, não a fidelidade dele com o assunto. Então o colunista vai servir para explicar o porquê você deve comprar produtos.

Para acabar, fica aqui o aviso: NÃO há nas publicações brasileiras coluna regular de Nutrição que não cometa erros graves no tema. E por fim, uma coluna de Nutrição regular infringe uma lógica cruel; ela vai sair independentemente de haver ou não assunto a ser tratado. E nessas horas, vale tudo, até escrever qualquer coisa. Nutrição em livros escritos por nutricionistas ou em colunas de revista raramente sobreviveria se o critério fosse qualidade. É melhor não arriscar.

*para entender melhor, você pode ler sobre esses estudos em 3 textos excelentes no The New York Times, no Huffpost ou em português no excelente blog Medicina baseada em Evidências do monstro e médico Luiz Correia.

**aqui recomendo a leitura de Reckoning with Risk, do monstro Gerd Gigerenzer.

***Por que não prescrever dieta? Porque a Nutrição simplesmente desconhece quase que por completo a ideia do quão fundamental é a não-linearidade do consumo de nutrientes e energia. E um cardápio é JUSTAMENTE em sua essência a ideia do profissional controlar por você linearmente o consumo desses. Ou seja, é um profissional indo perigosamente na contramão da segurança e efetividade.

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