Eles e Nós. Ou: um drone não é um disco voador!

Senta que lá vem textão…

Ainda no vácuo de minha palestra de semanas atrás no “Tribo Forte ao vivo”, onde falei sobre os benefícios e desafios de uma dieta low-carb em corredores amadores, acabei escrevendo um texto sobre alimentação em provas mais curtas, de até pouco mais de 1h00. Corredores, sabemos, adoram se sentir especiais, gostam de achar que têm necessidades especiais para correr essas provas curtas. Bobagem enorme.

Naquele timing que só o acaso possibilita, uma celebridade no mesmo dia postou todo um programa de consumo de suplementos durante treinos em provas. Já vi coqueteis de doentes graves que tinham que tomar menos pílulas… É de chorar de rir que a nutricionista prescreva aquilo que não seja como efeito placebo, ou condenável por apenas fazer para ganhar comissão. Isso porque do porque do ponto de vista fisiológico qualquer micronutriente (seja BCAA, Q-10, beta-alanina, etc…), por seu fácil isolamento, é fácil demais de analisar seus reais benefícios. A primeira vez que fui estudar BCAA era 1997. São mais de 20 anos sem evidências! Um nutricionista que ainda prescreva sua suplementação a um amador não o faz de graça. Não tem como! (*se funcionasse, eu tomaria desde sempre e ainda ganharia uns produtos de graça)

Pois um dos meus motes na tal palestra, aqui sem querer ofender os envolvidos, foi o de martelar na tecla do quão pouco médicos e principalmente nutricionistas entendem desse esporte com o qual trabalham. Então como ir atrás de um nutricionista se ele mal entende o básico? Só alguém que não corre e/ou não entende o básico dele para ficar recomendando Q-10, BCAA e afins.

Mais uma vez ele, o timing

Enquanto pensava sobre tudo isso postei um dado curioso: a inacreditável versatilidade de Mo Farah. O britânico pode nunca ter ameaçado um recorde mundial, mas seu currículo de recordes pessoais dos 800m à Maratona é inacreditável!

Sempre que um nutricionista justifica prescrever BCAA (sempre ele) a um amador porque um estudo nebuloso feito com triatletas profissionais que consumiram não-sei-quantos-gramas-por-dia teve benefício marginal, ele ignora o básico: nós não praticamos o mesmo esporte.

Eu, modéstia à parte, sou um amador rápido. Porém, posso afirmar sem arranhar minha autoestima, que eu não pratico o mesmo esporte que Mo Farah.

O esporte, assim como a Natureza, é feito de extremos

O esporte, desculpe a nerdice, é regido por extremos, por eventos de cauda longa. Queremos saber quem é o mais rápido, o mais resistente. Não existe meio termo. Um atleta como Farah correu o recorde europeu nos 42km. Por outro lado, já correu os 800m abaixo de 1’50”. Veja bem, sem a nutricionista-que-não-entende-de-corrida (e nem de Nutrição) saber, se você apresentar o atleta informando seu PB apenas nos 400m OU na Maratona, ela irá prescrever suplementos diferentes ao mesmo atleta. Creatina ao primeiro, BCAA ao segundo. Sendo que o multimedalhista olímpico pode derrotar qualquer maratonista que você conhece ou mesmo seus amigos velocistas.

Farah, e aqui quero que você entenda que qualquer atleta de elite, daria uma SURRA em qualquer amador que você conheça na distância que VOCÊ escolher.

Uma vez que nosso corpo (profissional ou amador pangaré) responde não às distâncias, mas ao tempo de esforço (isso é Fisiologia básica e vagabunda que o nutricionista que atende amador parece sempre ignorar), normalizar abordagem dada a atletas velozes (seja um Mo Farah ou um etíope bem mais lento e menos conhecido) é como usar a mesma abordagem dada a um jogador de badminton. Não faz sentido algum. Só tem nexo na cabeça do profissional que não entendeu absolutamente nada.

Por mais que seja danoso à sua autoestima, aceite algo fundamental: aos olhos e às regras da Fisiologia e do Treinamento (e da Nutrição), você não pratica o mesmo esporte que Mo Farah.

Mas por que então acha que pode ou deve consumir a mesma coisa?!

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15 pensamentos sobre “Eles e Nós. Ou: um drone não é um disco voador!

  1. Julio Cesar disse:

    Eu até diria que a maioria dos corredores nem pratica esporte….

    Sempre lembrando que teimosia não é esporte.

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  2. Pedro Ayres disse:

    Além de querer sentir-se especial, existe a questão de ser aceito socialmente. Quanto mais dos penduricalhos do aspecto social você aderir, melhor aceito: assessoria, nutricionista, fisioterapia preventiva, suplementos, equipamentos caros, personal cardiologista…

    Lembro que no auge do meu ciclismo (pausa para risos abafados), do alto dos meus 1600km mensais (quantidade e intensidade risível se comparada a profissionais), colegas insistiam para eu usar suplementos, e minha negação era vista como teimosia. Pois é.

    Agora, como já dito por aqui, ninguém quer aderir ao reloginho casio com cronômetro, às estradas de terra esburacadas, ao bom e velho descanso apropriado. Descanso não dá likes. Talvez um dia dê, quando as pessoas começarem a medir e postar sua ‘resting heart rate’: quem tiver o menor número vai se orgulhar do seu melhor condicionamento físico.

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  3. Luis Oliveira disse:

    Balu, se tu é o primeiro a reconhecer que amadores e profissionais praticam esportes diferentes, por que insistir em medi-los com a mesma regua? Deixe-me explicar…

    Um profissional é medido ÚNICA E EXCLUSIVAMENTE pelos resultados. Correu rápido? Ganhou? Beleza. Correu mal? Perdeu? Até mais.

    Já para o amador essa reguá é inadequada, pois o esporte dele é de “participação”. Por isso, ao invés de focar no resultado, o foco do amador é no PROCESSO. E isso é correto. Amador deveria se preocupar em percorrer o caminho, não com o destino (usando uma metáfora de Paulo Coelho aqui, se me permite) Ou seja, fazer os treinos, comer direito, descansar, ser consistente, etc.

    Os problemas surgem quando esse processo se torna torto. Ao invés de fazer o essencial do processo (o treino), ele se preocupa com o acessório do treino (os suplementos, as meias de compressão, etc.) Mas veja que isso é natural, quase inevitável, pois em quase todo o processo o controle é parcial e imperfeito, o acessório ele tem sob controle total e com gratificação instantanea. Quer coisa mais gostosa do que comprar um tenis novo, “responsívo e que retorna energia”?

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    • Danilo Balu disse:

      Rsrsrsrsrs não sou que define que o importante não é o resultado, é o amador quem define!

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      • Luis Oliveira disse:

        Não entendi. Então tu acha que o importnte para o amador também é só o resultado?

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      • Danilo Balu disse:

        Não não! Não acho! Ele que acha! É sempre ele quem define o que é importante.

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      • Luis Oliveira disse:

        Balu, estou preocupado com os amadores que voce conhece, parecem ser um povo particularmente louco. Os que eu conheço não vivem essa delusion de que podem obter resultados, só tem foco nas margens do processo.

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      • Danilo Balu disse:

        Na verdade eu sempre acho que o amador FALA uma coisa qdo no fundo no fundo ele QUER outra…. é tipo a pessoa que fala que quer emagrecer, mas janta pizza todo dia… ele espera cair do céu. O amador FALA que quer desempenho, aí ele treina 2x na semana e importa whey e vai no churrasco da assessoria beber muita cerveja depois do longo de 8km.

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  4. Antal Varga disse:

    Eu não tenho dúvida alguma sobre não praticar o mesmo “esporte” que Sir Mo. Aqui vou concordar com o Julio e também com o Luis: competição de corrida é nas provas oficiais da IAAF e filiadas, Olimpíada etc.
    Sabe aquela maratona ou outra prova na sua cidade ? Então tem um grupo chamado elite, esses largam antes pq estão competindo. Os demais largam depois pq estão participando de um evento de corrida.
    O 1º grupo está mais do que focado no resultado, em ganhar e o 2º, no processo. Cada qual com sua motivação. É bem simples, qdo vc estiver botando para quebrar no 2º grupo, talvez seja a hora de tentar algo no 1º.
    E o comentário do Pedro foi bem pertinente. Em meu último eletrocardiograma (faço pq com 47 anos estou ficando mais perto de ser tecnicamente idoso) minha frequência cardíaca em descanso estava abaixo do previsto. No laudo consta: bradicardia sinusal e o médico disse para esquecer…. seria um problema se eu fosse sedentário.

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  5. Julio Cesar disse:

    Então Balu, se nós corredores furrecos não praticamos o mesmo esporte que os atletas de verdade, não faz muito sentido amador ter planilha de treino e periodização, certo ?

    Gosto de ouvir um maratonista que vai tentar um “sub 4 horas” falar que está na fase do polimento…..

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  6. Andre Berlesi disse:

    Tudo isso é mto relativo ne… Pois par algumas coisas vc prega que os praticantes de corrida deveriam “copiar” a elite. Exemplo: correr sem GPS… Não usar meia de compressao, não tomar suplementos e etc. Em outras já fala que não praticamos o mesmo esporte… Mas que são atividadesdifferentes são.

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    • Danilo Balu disse:

      Não existe meio termo… Vc citou apenas intervenções (via positiva) qdo eu (e a lógica) pregam justamente o oposto: retirar intervenções. Pra recomendar usar meia de compressão (ou suplementos ou qq outra coisa) o proponente é que tem que dar evidências de que funcionam. Reparou já que NUNCA fazem isso??

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