Discutir estratégia da Maratona com o Treinador is the New Black

Nós perdemos nossa habilidade de pensarmos por nós mesmos. (…) Nós nos tornamos reativos em vez de pensar. Essa é a frase que li hoje de um dos mais pertinentes treinadores americanos que conheço, ainda que ele não estivesse falando de maratona. Nada mais sintomático, porém.

Faz poucos dias que foi realizada a Maratona de Berlim. Agora outras centenas de brasileiros irão à Chicago, Buenos Aires e depois Nova Iorque encarar 42km de desafio. E o que observo com frequência é sempre a mesma recomendação: converse e defina a estratégia de prova com seu treinador.

Mas… não vou ser eu quem vai correr?

A corrida é de longe um dos mais individuais esportes que existem. É também um dos mais básicos. Sempre que há essa aura, essa tentativa de querer lhe dar um ar de complexidade é como se quisessem quase que por insatisfação tirar essas características tão intrínsecas de simplicidade da modalidade. Tal como me disseram: as coisas hoje precisam ser complicadas, caras e sempre depender de um saber capitalizado. Nesse caso, o treinador a quem você paga.

Às vezes me sinto meio alienígena, porque eu nunca, jamais, nem mesmo em UM ÚNICO momento da minha vida tive um treinador que me falasse de tática ou estratégia de prova. Era um “boa prova” ou no máximo um “tente passar a primeira volta em X:XX“. E talvez haja aqui uma informação que seja fundamental: eu nunca paguei diretamente um treinador (foram sempre pagos por um outrem). Esses profissionais nunca tinham então que capitalizar seu conhecimento comigo.

Estamos jogando basquete!?

Porém, hoje os amadores e assessoria se reúnem, se encontram (meu Deus, que morte dolorosa) para discutir tática. Como assim?! Sim, alguns atletas mais novos que me conhecem menos sempre soltam um “vamos discutir a prova”. Mas não há o que ser discutido! Quando der a largada, você corre o que vinha correndo. E se prepare para sofrer horrores no último terço ou quarto da prova.

Se você precisa de alguém te falando que na subida você irá ver reduzir o ritmo ou falar que no oitavo quilômetro há uma ladeira, ou seja, que você ou não sabe o básico ou não consegue sequer enxergar o básico, então você não deveria sequer estar correndo uma maratona!

Certas coisas não precisam ser discutidas. Prova é replicar o treinamento. E é difícil não achar que a forma como se orienta atualmente o amador é responsável por parte disso. Como disse outro treinador: a melhor tecnologia de análise e orientação na corrida é um “gadget” que fica entre as suas orelhas. Quando você corre 100% dos seus treinos com um GPS calculando e ditando seu ritmo, uma cinta dizendo a quantos batimentos está seu coração, é improvável que você consiga “sentir” sua corrida e seu corpo, que você esteja apto a ditar e entender o que significam os diferentes ritmos.

Nesses casos, o único jeito mesmo é você deixar o seu treinador determinar o ritmo que na prova você quem terá que correr. Ainda que não deveria haver ninguém nesse mundo que soubesse melhor do que você aquilo de que – olhe isso – você é capaz.

 

*eu poderia escrever um texto similar sobre provas de revezamentos quando as pessoas insistem em sentar para “discutir a estratégia”. Sempre banquei o Romário nessas horas: ”moçada, na sua vez é só correr o mais rápido que puder, essa é a tática”.

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16 pensamentos sobre “Discutir estratégia da Maratona com o Treinador is the New Black

  1. Julio Cesar disse:

    Agora tenho um treinador, novamente.

    Degustação grátis por 30 dias.

    Sábado tenho uma corrida de 5 km.
    Se não tivesse treinador eu faria assim: Sair bem forte mesmo (sabe quando dá aquela moleza nos ombros ?), depois tentar manter forte e quase não conseguir respirar, e no último km tentar não deixar ninguém me ultrapassar..

    Preciso discutir com ele se essa é a melhor tática de prova.

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  2. james lehm disse:

    O pior é ouvir que vai discutir com o COACH a estratégia de maratona pra fazer em 5 horas. kkkkkkkkkkkkkkk

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  3. Eduardo Carvalho disse:

    Muito bom Balu, sempre acertando com os textos. Parabéns.

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  4. Marcos Paulo disse:

    Balu, lendo teu texto, lembrei dos vídeos com orientações relativas à respiração (!!!???) na corrida (risos). Achei maluca essa estória de, meio que, doutrinar a respiração do cara. Eu por exemplo, sofro de rinite alérgica o que acaba fazendo com que eu tenha que correr com a boca aberta (não tem outro jeito). Se eu for tentar fazer como os caras ensinam, já era…
    Abraço!

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  5. Isabel Lopes disse:

    Eu sinto necessidade de definir uma estratégia com meu treinador, eu nunca havia corrido antes e não tinha noção de dosar o pace, ou dar sprint no final…não sei se estou fazendo certo ou errado mas me sinto mais tranquila quando estou cumprindo o combinado, afinal o treinador estudou, tem mais conhecimento do que eu e está, no meu caso, há 10 anos na área treinando pessoas. Eu peço uma estratégia…cada um é cada um e todos devem ser respeitados.

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    • Danilo Balu disse:

      Se há tanta insegurança, será que era hora??

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      • Isabel Lopes disse:

        Era a hora sim, hoje estou mais confiante e consigo ser mais independente, mas aqui pelo visto tem um monte de xiita e todos ávidos por criticar e debochar do semelhante.

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      • Danilo Balu disse:

        Isabel, infelizmente não há como controlar o tom da resposta dos leitores nos comentários. Duvido que havia intenção de debochar de vc… Criticar é algo comum, não tem que haver medo.

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    • A questão é que se você não sabe como fazer, talvez não tenha sentido o que é correr até parar ou não conseguir correr num ritmo até p fim do desafio. A experiência do treinador não vai fazer você sentir o que precisa para saber qual a velocidade que você deve correr uma dada distância.
      Você é capaz, só precisa “ouvir” mais o que você pode.

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    • Janildo disse:

      Kkkkkkk! Coitada!!!

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  6. Julio Cesar disse:

    Precisa de treinador pra falar qual o momento de dar o sprint final ?

    Tragam meus sais…..

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  7. Rafael disse:

    Acho o diálogo entre o treinador e o atleta (amador ou profissional), interessante, desde que o atleta se conheça bem.
    O treinador normalmente tem mais experiência e o atleta conhece suas características, o que deu certo nos longos ou não.
    Agora ser um robô, seguir 100% o pace e o ritmo definido pelo treinador, sou contra.

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  8. Marcio Manzi disse:

    Balu, confiei em vc para pedir dicas (que hoje parecem tão obvias) para correr no frio.
    Suas dicas foram essenciais, bem como sua cordialidade.
    Poderia ter pesquisado ou buscado viver essa experiência para “sentir” como seria sem conversar com ninguém.
    Entendo a necessidade de buscarmos soluções prontas e respostas rápidas.
    Acho que a maior contribuição que vc proporciona para a humanidade e nós fazer pensar um pouco mais antes de sair “perguntando” ou contratando treinador”
    Gosto disso e sou seu leitor assíduo.
    As diferenças ficam para trás!!!!
    Forte abraço

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