Dias atrás falei sobre o “excesso de GPS na corrida”. Vou ser mais preciso e sucinto para quem não leu: correr SEMPRE usando GPS faz mal ao corredor.
Eu me lembro que quando fiz estágio com o Nelio Moura, melhor treinador de saltos horizontais desse país, vi que durante a prática os atletas NÃO podiam saber o resultado de todos os tiros nem de todos os saltos nos treinos. Eu presenciei (mais de uma vez!) salto que daria medalha olímpica e o atleta terminar a sessão SEM poder saber jamais quanto havia saltado.
Há embasamento para essa abordagem? Sim, há. A quantidade de feedback é overrated e não é por si só informação. Mais do que isso, sua onipresença é fumaça, atrapalha, confunde.
Na teoria da Aprendizagem e do Controle Motor, os melhores resultados de aprendizado são quando o indivíduo tem feedback de seu desempenho por volta de 50% e de forma aleatória, intermitente. Reproduzimos esses testes em laboratório, é incrível!
Se por um lado o feedback pode passar a ser um tipo de informação, uma ferramenta para o atleta comparar sua percepção com o resultado, por outro ele é uma espécie de barreira física que “acomoda”, faz o atleta prestar menos atenção a todo um ambiente que o envolve porque o feedback em si passa então a ser aquilo que deve ser observado. O resultado e não o processo passa a ser a meta.
Quando eu venho e falo que GPS sempre faz mal, há quem conclua aquilo que eu nunca disse. Um grande amigo disse que meu texto deu a entender, ainda que sem querer, que é como se eu dissesse que correr sempre SEM GPS seja o melhor. Eu nunca disse isso!
Se correr com GPS todos os treinos é a letra A, correr totalmente sem seria a letra Z. Há assim uma gama de outras 24 letras! Estou dizendo que há enormes evidências (práticas E teóricas) que A é RUIM, PIOR. Mas isso NÃO quer dizer que o extremo (letra Z) seria “o” melhor.
Uma das coisas que mais ouço é quase um tipo de desculpa pessoal. “Você tem razão, mas…” e a pessoa lista então como ela consegue correr SEMPRE com GPS, mas usando artifícios que anulariam o prejuízo. Sinceramente? Não acredito nisso. Primeiro porque não vejo como fazer esses dados virarem informação útil. Nenhum treinador precisa ou consegue usar tudo isso. Nenhum. Segundo porque desconfio que o feedback ainda que tardio tenha seu custo ao atleta.
Por fim, sempre tento deixar claro o quanto um GPS (ou qualquer outro apetrecho) pode motivar um atleta. Tênis novo, roupa nova, relógio novo, gráficos… o peso da motivação na corrida é imensurável. Se o GPS dá esse mundo de possibilidades (de fazer gráficos, ter dados, compartilhar tudo nas redes sociais) e isso te faz bem, ótimo! Use! O ponto simples desse texto é: os 2 mundos (100% de dados) e máximo benefício você NÃO consegue ter. O problema maior é quando você acredita que dá, sim, para tê-lo…
Bons treinos! Com ou sem GPS!
*para quem quer mais do assunto, reforço o convite para ler o ótimo texto de Steve Magness sobre o tema.
Ontem meu treino era: 1 km aquecimento + 3 km rodagem + 9 x 200 c/ 100 de trote + 3 km rodagem.
Equipamento usado no treino de ontem: Tênis (sem meia, pq esqueci de colocar a meia na mochila), sunga, short. Sem camisa pq estava abafado.
Como era treino de tiro curto preferi não usar nem cronômetro, não faz sentido cronometrar 9 tiros de 200, todos vão sair iguais e inclusive eu já sei o tempo.
Hoje tem rodagem de 8 km e o equipamento vai ser o mesmo, só muda o tênis para o Noosa Tri 10.
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Viu este comentário no post do Steve Magness?
Acho que é um pouco por aí também:
I am a psychologist so I understand to what this refers. Even so, reliance on feel, affordance and situated actions is good for the here and now, not the future. My body’s feel knows nothing about my goal for me to be able to run faster or longer over a twelve-week training program. It doesn’t know I plan to run at this speed in two hours’ time. It doesn’t know I plan to keep running into my sixties.
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Boa Balu! A idéia é essa, o uso moderado do GPS para ser uma referência apenas. Mas não uma muleta tecnológica. Tenho feito os treinos de ritmo, de 20 a 40min com o GPS, mas não olho para a tela em nenhum momento. O objetivo é avaliar se estou mesmo conseguindo fazer o estimulo na intensidade correta, sem oscilar, sem quebrar, etc. Um ótimo aprendizado!
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Fiz alguns treinos assim, só que progressivos (que meu treinador na época chamava regressivos).
Rodagem na rua ou de preferência na pista e cada km tinha que ser 10 segundos mais rápido que o anterior.
Sem GPS, batendo no cronômetro só nas passagens, olhar o resultado só quando acabar o treino.
É um tipo de treino inimaginável para a maioria dos corredores de hoje.
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Balu, por favor, qual o estudo que fala sobre os 50% aleatórios de feedback?
Era só sobre aprendizado de gesto motor ou sobre qualquer aprendizado?
Valeu
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Oi Carlos!
Tudo bem? Deixei passar seu comentário aqui…. cara, aí vc me derruba… estudei isso por volta de 99-2000… não tenho aqui fácil sem recorrer ao meu material que está no Brasil!
E falo sobre aprendizado de gesto motor simples (arremessos simples, na horizontal, calculando distância a um alvo).
Abrax
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Valeu
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Da minha parte acho que as pessoas estão complicando demais o esporte mais simples do mundo. Acho estranhas essas planilhas dizendo que tem dar 6 tiros de 1.147 metros em 5:49 mim. Bobagem. É só inserir uma ou mais variaveis (cansaço, alimentação, etc ) que a calculeira vai toda pro espaço. Muito melhor se concentrar na sensação de esforço, escutando o próprio corpo.
Nesta semana teve um documentário sobre os tarahumaras que não tem treino formal, frequencimetro, nada disso e deixam 99% dos corredores “equipados” comendo poeira. Keep ir simple.
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Belíssimo texto. Concordo com o prejudicial uso desmoderado de monitoramento na corrida. Gosto do gps no intervalado, corro na rua, não tem marcação e não tenho pista decente perto de casa, então controlo pelo garmin. Mas se tá na planilha 90 min de corrida com esforço médio, vou só com o cronometro ligado.
Conheço gente que monitora a frequência cardíaca na corrida, até aí ok, mas o estranho é o cristão pirando pq ta com certa FC… nada contra, mas acho esquisito.
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